Linda Flávia
Linda Flávia
“Aproveite em vida. Em um dia qualquer brincava na escola e desmaiou. Ela morava bem perto, em uma rua aqui ao lado.”
Eu e minha irmã brincávamos muito quando crianças. Mas haviam presentes que estavam proibidos. Uma boneca de porcelana e alguns carrinhos mais caros. Crianças da nossa idade, aproximadamente 4 anos, não cuidam dos brinquedos. E esses eram especiais, eram presentes de um grande amigo da família.
Com frequência, enquanto brincávamos sob o cuidado de alguma vizinha amiga, minha mãe levava minha avó ao médico. Várias eram as doenças de minha querida avó. Um certo dia, enquanto elas estavam sentadas nos bancos do ônibus, uma menininha de uns dez anos de idade com seu longo cabelo liso parou ao lado delas. Minha mãe ofereceu colo a ela.
As duas mães, a minha e a da menina, conversavam durante a viagem. Elas perceberam que estavam indo para o mesmo hospital.
Esses encontros ocorreram por diversos dias, sempre com minha mãe oferecendo colo para a mocinha.
Passaram-se algumas semanas sem a mãe e a menina aparecerem no ônibus. Foi quando muito tempo depois apenas a mãe da moça encontrou a minha durante uma viagem. Ela explicou que a jovem estava com câncer e ficou internada por todo esse período.
-Vou visitá-la em seu quarto – Falou minha mãe.
Ao chegar no quarto da mocinha, ela estava deitada, magra e sem nenhum fiozinho daquele lindo cabelo que tinha. A mãe da menina saiu do quarto e a mocinha pediu ajuda para ir ao banheiro. Minha mãe ajudou. Ela estava tão magrinha que, ao limpa-la, minha mãe sentiu apenas a pele e os frágeis ossinhos da menininha.
Após alguns dias, a pequena menina infelizmente...
As mães se encontraram algum tempo depois na rua. A mãe da mocinha sabia que a minha avó tinha várias doenças. Por acaso a menina havia ganhado duas cadeiras de rodas, uma infantil e uma para adultos, agora sem serventia. E uma cadeira de rodas era justamente a preocupação de minha mãe naquela semana, afinal, já não conseguia andar direito minha avó.
Como moravam perto, elas marcaram de se encontrar na casa da menina para minha mãe receber a cadeira.
Ao entrar na casa, andaram até o quarto da jovem. Várias bonecas dentro de caixas estavam expostas em prateleiras na parede rosa do quartinho.
-Por que essas bonecas estão na caixa? – perguntou minha mãe.
-São brinquedos que iríamos dar a Flávia quando ela tivesse mais idade, para não quebrar, são presentes caros. Ela sempre quis brincar, mas não deixávamos para não estragar.
Minha avó estava em casa com minha irmã e eu. Minha mãe, para o espanto da vovó, pegou os tão especiais brinquedos e nos deixou brincar. Quebraram aproximadamente em uma semana.
“Melhor algo quebrar em uma semana do que quebrar para sempre.”