O relógio

As horas, as horas, as horas…Que horas são? olho pro relógio impaciente. Eu ou o relógio? ambos. Éramos agitados, frenéticos, contando o tempo e trabalhando sem parar. De repente o relógio pára. Porque não passam as horas? porque o ponteiro está rígido? o segundo congelou também? o frio? a chuva? a maresia? as pilhas? não, mas elas são novinhas, não são as pilhas, foi o tempo que parou? O tempo do labor, da labuta, da colheita, da peneira que voava mais rápido que um segundo, da pisada do pilão, da faca que cortava a carne, do freguês apressado, o tempo das crianças chegarem da escola, da lenha queimar no fogão, do feijão cozinhar, o tempo corria, voava, voou. O tempo comeu todo o feijão. Quase cem anos o tempo cansou, eu não cansei, e não quero parar. Confundo-me com o tempo, me torno relógio, quebrado, sem pilhas, sem tic tac, sem nada. “Me dá um remédio pra dormir?”