Perdeu Mané!
16.10.24
553
Sentado em um vagão do metrô, lia absorto o seu livro.
Estava sozinho. Era tarde da noite e voltava para casa
depois de um dia produtivo, mas cansativo. E o livro, que
o empolgava pelo enredo, distraía-o.
Tratava-se de uma novela envolvendo um policial infiltrado
em uma gangue de traficantes. Lia o capítulo em que o
espião estava entrando em uma estação do metrô com um
dos bandidos e o traficante já desconfiando do
companheiro. A tensão pairava no ar envolvendo-o
inteiramente na estória. Lia avidamente para saber o
desfecho. No diálogo, o bandido pretendendo desmascarar
o policial, induzia-o a isso com perguntas.
– Então tu mora no Jardim Ângela. Tá tratando da venda
dos bagulhos lá com o Jacaré, né, cara?
– Jacaré não opera mais lá, tu sabe mano. Agora é o
Dumbinho. Perguntando por quê, mano? Tá desconfiado?
– Meu! Tu sabe que tem muito traíra no pedaço e tu pode
ser um, mano.
– Tá com dúvida, ligo pra ele agora e tu confere!
Sozinhos na plataforma de embarque aguardavam a
chegada da composição. Entreolhavam-se com
desconfiança. O trem chegou, parou e as portas se abriram.
Imediatamente, o bandido puxou sua arma para atirar no
outro. Este, agarrou a mão armada do traficante e pulou
com ele para dentro do vagão.
Ele, leitor, viu os dois caindo no piso metálico do trem em
uma luta desesperada. O policial segurava o braço do
bandido com a pistola em punho.
– Vou morrer, pensou assustado.
As portas se fecharam. A composição começou a andar com os
lutadores engalfinhados no chão. Ele assistia desesperado
ao embate, sozinho no vagão, sem ter o que fazer,
petrificado em seu assento e com o livro no colo.
Encolheu-se todo, aterrorizado. Vou morrer, pensava
estático e aparvalhado com o que assistia.
Os dois rolavam no piso do corredor do vagão. O bandido,
que era mais forte, conseguiu se soltar e virar por cima do
policial dando-lhe uma forte cabeçada. Deu três tiros no
infiltrado, um deles na cabeça, explodindo o cérebro que
expulsou massa encefálica pelo chão. Um horror! Vou
morrer, seguia pensando. Terrificado, apertava o livro em
seu peito. Seu coração batia desenfreadamente. Ele
transpirava muito.
O bandido, desvencilhado do policial morto, levantou-se,
olhou para ele que continuava aterrorizado em seu canto,
apontou-lhe a arma e disse:
– Perdeu mané! E disparou duas vezes.
Acordou e pulou do assento dando um grito ofegante. Os
outros passageiros, que eram dois, olharam assustados para
ele. Ao vê-los, ficou espantado e começou a tremer mais
ainda, pois eram os personagens do seu livro.
Assim que as portas do vagão se abriram, ele, apavorado,
saiu correndo desesperadamente, deixando o livro sobre o
assento. Em sua corrida enlouquecida, sem olhar para trás,
só conseguia pensar:
– Vou morrer!