Uma flor especial

A moça caminhava em um ritmo rápido, imersa em seus pensamentos, o cenho levemente franzido.

Tentava relaxar e aproveitar o privilégio de andar ao ar livre, naquele lugar quase fora da cidade, onde se via as plantações e pontas de mato. Em plena pandemia isso era um momento raro. As regras tinham afrouxado um pouco e na pequena cidade tais passeios estavam liberados. Mas tinha que usar máscara e manter distância de outras pessoas.

Indizível a angustia que todos estavam passando. O medo de adoecer e morrer. A perda constante de amigos e familiares. O perigo cercava por todos os lados, invisível e mortal em forma de vírus. Qualquer um poderia ser a próxima vítima.

Além da pandemia uma estiagem prolongada, complicava ainda mais a situação. As plantações de soja e milho torravam debaixo de um sol inclemente. Mas o verde das buvas, capins e carrapichos, que são nativas deste chão, contrastavam com as plantas esturricadas.

Mas neste dia um pouco de esperança pairava no ar. Então algumas pessoas ousaram sair ao ar livre. Além moça, uma família também andava por ali, mamãe, filha e filhinho de uns quatro aninhos. Iam em direção oposta.

Mas, ao ver a moça, o menino rechonchudinho e alegre, agitou-se. Dava umas corridinhas e olhava para os lados procurando algo. Até que correu para a capoeira mais próxima e apanhou um comprido talo de capim nativo com uma pluma branquinha na extremidade, parecendo uma pequena nuvem.

A moça já estava bem perto e ele correu sorridente, com suas pernas gordinhas, ergueu o braço com o capim na mão e falou todo contente:

- Uma floi pa pof. Traduzindo: uma flor pra professora.

Ela abaixou-se e pegou delicadamente a florzinha, agradeceu e atirou um beijinho para o querido que saltitava sorridente em sua frente sob o olhar da mãe e da irmã.

Eles não se conheciam, nunca tinham se visto. Mas ela era mesmo professora e o menino tão carinhoso e lindo tinha síndrome de down.

Os olhos da moça ficaram marejados, ela gostaria de dar um grande e caloroso abraço no menino e sua família, mas tal gesto não era recomendável no atual momento. Então limitou-se a afastar-se um pouco, baixar a máscara e agradecer com um grande sorriso.

Todos então seguiram seu caminho.

A moça agora caminhava mais leve e alegre. Tinha certeza que tudo iria melhorar. Que a vida logo voltaria ao normal.

Quando chegou em casa, meditou sobre o belo e inesperado gesto da criança e guardou aquela flor especial em meio as páginas de seu livro preferido.