A Ladeira do Amor
09.10.24
552
Caminhavam pela rua íngreme, quase que diariamente. Não se conheciam, mas sabiam que tinham algo em comum: aquele trajeto – a subida e a descida da ladeira.
Ela era morena de cabelos longos, cacheados e pretos, mas já com alguns esbranquiçados que lhe davam um charme. Não era tão jovem, talvez nos seus trinta e cinco anos. Tinha estatura mediana, corpo roliço e pernas grossas. Usava sempre a mesma roupa preta: calça de ginástica, camiseta e casaco de agasalho.
Ele era alto, corpo atlético e magro, pele bronzeada, cabelos loiros e curtos e deveria estar nos seus quarenta anos.
Usava sempre shorts azul escuro, camisa de manga longa azul-celeste e tênis com meias azul-marinho. Eram semelhantes em suas vestimentas de cores repetitivas e frequentes. Talvez fosse um traço comum em suas personalidades, a constância.
O andar dela era calmo, até pesado. A expressão de tristeza em sua face, nas paradas das esquinas para cruzar a rua, demonstrava cansaço.
Ele não demonstrava cansaço ou incômodo em suas feições, mantinha um caminhar decidido e firme.
Naquele dia, ele a viu na subida da rua, do outro lado, estava parada na esquina aguardando o sinal fechar para atravessá-la, e pensou:
– Estamos nos encontrando sempre nos mesmos horários e com as mesmas vestimentas. Acho que ela tem “cara” de Helena.
No mesmo instante ela o vê e o encara com um olhar breve, meio furtivo e fala para si:
– Cruzamo-nos quase que todos os dias nesta ladeira, com as mesmas roupas, é muita coincidência. Acho que deve se chamar Heitor.
O semáforo demorava a abrir, eles se entreolhavam como que dizendo que podiam muito bem se conhecer, porque se encontravam quase que diariamente naquela rua. Ele sorriu, ela retribuiu. O sinal abriu, ela atravessou a rua e ele foi ao seu encontro.
– Oi, tudo bem? – diz ele.
– Tudo!
– Sempre nos cruzamos neste caminho, não é mesmo?
– Pois é, ora eu subindo e você descendo, ora eu descendo e você subindo.
– Qual é o seu nome? – pergunta ele.
– Helena!
Ele surpreso não acredita ter acertado o nome dela.
– Não acredito! Eu achei que era esse o seu nome e você me confirmou, que coincidência, não?
– É mesmo? Puxa vida!
– Agora só falta você acertar o meu.
– Olha, eu te olhando agora a pouco achei que tinha “cara” de Heitor, acertei?
– Acertou! Incrível! Não é possível! Temos muita coisa em comum, não acha?
– Temos Sim! Impressionante mesmo!
E assim se conheceram, se enamoraram e se casaram. Tiveram filhos e seguiram mantendo a rotina do sobe e desce naquela rua que nomearam de: a ladeira do amor.