Rediviva 4 – Desabafo
Querido diário: da contenda verbal com o jovem Serafim, ali nas imediações do Colégio de Santa Teresa de Jesus, em Santo Tirso, resultou apenas uma história sem ponta por onde se lhe pegue, pois, as pessoas, normalmente, não discutem por não conseguirem distinguir uma mesa de uma cadeira, uma renda de bilros de uma janela ou um galheteiro de um napperon.
Mas, se passarmos de objetos para factos sociais, o caso muda de figura.
Aquilo que para um grupo étnico se aproxima de uma “agressão”, para membros de outro grupo será antes “defesa” ou “revolta”; o que para um grupo tem toda a aparência de uma “libertação”, para outro grupo parecerá “escravização”; o que para um grupo parece “reeducação” para outro será “perseguição”; o que para um grupo é tido como “ditadura”, para outro é “verdadeira democracia”; aquele que para um grupo é tido como “herói” para outro não passa de um “criminoso”; e a lista de conceitos pode prolongar-se até ao infinito.
Porque será, caro Diário, que pessoas de cultura e, sobretudo, de nacionalidades diferentes, veem o mundo social de maneiras tão diferentes?
Sobre esta visão dependente, tenho presente o facto de Frei Leão de S. Tomás – douto coletor de passagens para compor a Beneditina Lusitana – ter defendido ser duplex o Mosteiro de Santo Tirso; isto é, ser mosteiro que, antes e depois do Concílio Niceno II, reunido de 24 de setembro a 23 de outubro de 787, acolhia frades e freiras separados até ao momento de rezarem no Templo.
Como pode Frei Leão concluir tal ideia de umas palavras tão ambíguas que cita? Numa escritura, D. Gonçalo Pais nomeia as terras que deixa a seu pai Paio Gonçalves, fazendo menção doutras que deixa ao Mosteiro de Santo Tirso, com estas palavras: “deixo estas propriedades ao Mosteiro de Santo Tirso, para os religiosos ou religiosas que nele perseverarem em vida Santa.”
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Viver no campo, continua a ser augúrio de serenidade. Em julho, tratamos da extração do mel, e a subida da temperatura ambiente aconselha a que se prossiga no arejamento das colmeias e na colocação de recipientes com água. Acalento também memórias de Santo Tirso já ter sido um importante abastecedor de casulos para as fábricas de seda do Porto, através dos múltiplos cultivadores do bicho-da-seda.
Mas o que permaneceu imutável, desde os tempos em que eu, Amarílis, tive alma de mulher mortal, foi o som triste dos sinos soando a defuntos. Com que sonoridade lúgubre e perpétua estão a anunciar, na torre do templo, as promessas de felicidade futura!
Amarílis - fabricia.amarilis@gmail.com