D. Cotinha funga
D. Cotinha funga
Parece ter sinusite, rinite, bronquite...
Ela mesmo fala:
- Bom dia, D. Cotinha.
- Dia, minha filha.
- Como vai a senhora?
- Tou aqui minha filha. Como Deus quer. Não vou bem não...
- Não vai bem por quê?
- Porque hoje tá atacada minha sinusite, rinite, bronquite, artrite, nefrite, colite...
Enquanto D. Cotinha desfiava o rosário de ites, Marinalva ia passando e antes que ela terminasse já havia dobrado a esquina. Não dava para esperar D. Cotinha terminar a lista, era extensa. No entanto, não faz mal, a octogenária continuava o rosário com quem vinha próximo e lhe saudava.
É assim toda manhã depois do sol se levantar, depois de tomar um café gordo com uma boa de uma mesa posta por Grimalda, depois de ralhar com a moça e mesmo com tudo sempre perfeito há sempre alguma coisa para reclamar, o suco estava sem açúcar ou doce demais, o café muito quente ou frio demais, a xícara não estava bem lavada ou o quente-frio não estava perto dela.
D. Cotinha postava-se na varanda para reclamar da saúde, que ia muito bem obrigado. Contudo, fungava, falava e fungava, fungava e falava. E prestava atenção quando alguém lhe dizia de alguma doença nova, se terminava com ite gravava o nome para adicionar a seus problemas de saúde.
O que ninguém desconfiava era que não era somente para reclamar da saúde que D. Cotinha falava esses nomes, ninguém nunca sabia que era porque ela sempre achou bonito esses nomes todos de doenças: sinusite, rinite, bronquite, artrite, nefrite, colite, espondilite e ites e ites. Não fosse só porque era bonito ter esses vocábulos na sua boca, provocava ternura das pessoas, mesmo alguns acreditando naquele arsenal de patologias e mesmo não acreditando que havia uma só delas.
E assim eram os dias de D. Cotinha, mas que ela fungava, isso sim, fungava.
Rodison Roberto Santos
São Paulo, 01 de outubro de 2024