O CAMUMBEMBE DA ESTAÇÃO
Ele carregava sacolas em uma mão e na outra um livro de capa preta gasta pelo tempo. Dizia que Ele viria com poder e grande glória, porém quanto ao dia exato nenhum ser era capaz de saber, pois seriamos surpreendidos. Usava vestes sujas e desbotadas pelo sol. Devia ter uns 40 anos ou talvez até menos, o sol e a fome castigam e envelhecem o ser humano de uma forma inevitável. Alguns transeuntes, deixavam um troco aqui, uma marmita ali, honrados pela virtude teologal que conduz ao amor a Deus e ao nosso semelhante, matavam a fome e a sede.
Era a primeira vez na cidade. Viera de outro estado em busca de oportunidades melhores. A capital sempre foi o alvo de quem queria algo além da mesmice do interior, mormente das regiões pobres. Nem tudo sai como o esperado, acabou nas ruas e sem emprego, mas a vida ainda sorria para ele. Ainda existiam pessoas bondosas como a Dona Cristina que quando podia, levava-lhe roupas usadas em bom estado e conseguia-lhe um serviço na casa dela.
Bebeu o copo de refrigerante de uma única vez após devorar ferozmente a sanduíche, e eu o levei comigo até a minha casa para tomar um banho, fazer a barba e aparar o cabelo. O sábado de verão fervia as ruas. Atendia por Egídio, educado e denotava ser bem inteligente e confiável. Falou das suas aspirações e que ainda acreditava que venceria na vida.
– Eu tenho muita vontade de voltar para minha terra, antes quero vencer aqui. - falou.
– E vencerá! Você já é um vencedor. Saiu da terra natal e veio tentar a sorte aqui, quanta coisa passou até aqui? Só você sabe o quanto foi difícil, mas você venceu a si mesmo fazendo isso - respondi.
Logo estava bem mais apresentável. Naquele dia conversarmos muito. Depois de uns dias e já com tudo organizado consegui um emprego com Antonino, um amigo que na época morava no nosso estado e tinha uma oficina de marcenaria. Retornamos ao mesmo local onde o encontrei: Rua Soledade, Terminal Rodoviário Boa Viagem. Tomou o ônibus para uma nova vida, lá teria emprego e poderia recomeçar. Nos despedimos e vi que estava emocionado.
– Está tudo bem com você, Egídio? – perguntei.
– Sim. – respondeu ele.
Dei-lhe todas as coordenadas de onde deveria ir, o endereço da oficina, um trocado para a comida durante a viagem. Agradeceu bastante, mas parecia perdido, seus olhos pareciam procurar alguma coisa. Eu sabia que ele não estava bem. Talvez fosse só o nervosismo. Ele sabia que era uma oportunidade de vencer na vida. A única notícia que tive sobre ele foram meses depois quando meu amigo veio me visitar, era outono e Antonino chegou dizendo que quando estava na estação rodoviária, antes de embarcar, avistou um homem com as mesmas características que eu o havia dado. Segundo ele, o homem era um pedinte e estava com uma bíblia e vestes rasgadas.