Um pão de queijo ou o fugitivo e o mar.

Um pão de queijo

O ônibus chega à rodoviária de Porto Alegre, Miguel se levanta, rapidamente, daquele espaço abarrotado de pessoas e odores. As pernas doem, desce e estica-se, depois entra na fila para retirar a sua bagagem. Enquanto, espera, olha ao redor, é um lugar grande, tumultuado de lojas, restaurantes, lanchonetes, pessoas e crianças chorando. “Será que a Aninha cresceu muito”, pensamentos vão e voltam como ondas.

O motorista entrega a mala surrada meio manchada e duas mochilas com as comidas que a mãe lhe dera. Desce as escadas em direção às lanchonetes, escolhe uma mais vazia que parece ser mais acessível nos preços, mas fica enojado só de olhar o chão cheio de respingos e restos de comida. Entra, chega ao balcão gorduroso, observa as várias garrafas de bebidas encostadas na parede. A atendente olha com descaso e ar sonolento, levanta-se

- O que o senhor quê? Já olhou o cardápio? - Ela pergunta com uma voz estridente.

- Não olhei. Quero um pão de queijo e um café forte. – Ele responde sem pensar muito.

O pão de queijo e o café vêm rápido, ambos são horríveis, o homem cospe a metade do massa do pão no prato e reclama com a moça.

- Que pão de queijo ruim, na minha terra são muito melhores.- Miguel diz para a mulher.

- Pode pagar no caixa, é dinheiro ou pix,não aceitamos cartões. - Mulher fala e olha meio enviesado para ele, retira o prato e a xícara.

Miguel sai da espelunca, ainda precisa pegar outro ônibus para ir à casa dos primos, lá na Barra de Tramandaí, um lugar bem afastado de onde ele morava. Desde aquele dia vive assim pela beirada das coisas, “foi um acidente se diz sempre para se perdoar”, mas, sabe que a sua consciência e as pessoas não viam assim. Na cidade pequena em vivia, no Interior de Minas gerais, era um assassino. Observa as famílias, apressa o passo, está quase na hora do outro ônibus, sem querer dá encontrão numa moça, leva um susto. A mulher possuía uns olhos verdes, “não, os olhos de Teca eram como o mar” Pensa, controlando bagunça que permeia a mente sentindo uma vontade imensa de tomar uma branquinha. “Não, não pode, essa coisa já desgraçara a sua vida.” Precisa chegar logo, há muitos policiais pela rodoviária.

As portas do ônibus se abrem, o motorista desce para conferir as passagens, Miguel é o primeiro da fila, quer entrar logo.

- Passagens e documentos em mãos. – O homem visa

Quando o sujeito pega a sua identidade. Ele olha para baixo, a cara enfiada no boné.

- Pode subir moço! – O motorista grita.

O ônibus sai, ele dorme um pouco e quando acorda, já estão quase chegando a Tramandaí. Uma cidade movimentada, menor, com as mesmas coisas, pessoas, lojas, tumulto e poucos policiais, segundo a mãe. Pega a mala e as mochilas, vai em busca do ônibus para ir à casa dos primos, em uma pequena vila de pescadores na Barra de Tramandaí. Ele precisa se apressar, o ônibus para lá, sai às 17h, em um terminal perto de um tal de Camelódromo, não está escuro ainda, caminha sem olhar para os lados.

É uma viagem rápida pela cidade até a casa dos primos, não sabe muito bem o que dizer, mal os conhece, só de imagens. “Será que vão perguntar por elas”? A mãe tem a língua solta deve ter contado tudo”. Consome-se, mentalmente, quando o cobrador avisa que é a parada dele.

Bate palmas numa casa verde, ainda em obras na rua e o número indicados, de onde ele estava, podia ouvir o barulho da água, o coração acelera. Um homem abre a porta e diz.

- Entra, pelos fundos, primo e deixa as tuas coisas lá. – Diz o homem.

- Vou te levar para conhecer o mar. A tia disse que tu nunca entrou no mar, depois me entrega os pães de queijo que ela me prometeu.- Ele continua falando.

Largou a mala e as mochilas no quarto minúsculo, escuro com uma pequena janela em que Miguel viu um cantinho do céu. “Estava ótimo, sem elas, nenhum lugar no mundo seria bom”. Saiu do quarto, encontrou o primo e seguiram por mais ou menos duas quadras, o cheiro da maresia e o vento o atingiram como um açoite. Estava em frente a uma extensão não muito grande de areia em que os pés afundavam, era final de tarde e o sol refletia sobre a água mostrando um brilho dourado como os cabelos de Teca.

Miguel tira os tênis, o casaco e vai caminhando, lentamente, em direção ao mar.

Marisa Piedras

26/04/2024

Marisa Piedras
Enviado por Marisa Piedras em 30/07/2024
Reeditado em 02/08/2024
Código do texto: T8118391
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