Na era dos tobogãs
Gilberto Carvalho Pereira - Fortaleza, CE, 16 de julho de 2024
Na vida de qualquer pessoa há sempre expectativas ou promessas a serem cumpridas. Entre o casal, Laís e Augusto, ambos nascidos em uma cidade do interior maranhense, ela com 23 anos, ele 26, casados há três anos, havia a promessa de conhecerem Fortaleza. A avó do marido, cearense, sempre falava bem do local onde nascera. Entusiasmado pelas histórias que a velha senhora contava, o rapaz prometera à sua noiva que só se casaria quando fosse possível passar a lua-de-mel na cidade de origem de sua querida avó.
Infelizmente isso não fora possível, a noiva engravidou antes da data programada para o casamento, e tiveram que se casar às pressas, mesmo sem condições para tal. Devido a uma queda, o embrião da criança esperada não se desenvolveu, sendo expulso ato contínuo. Isso não os esmoreceu, com muita vontade de vencer, intensificaram suas jornadas de trabalho. Já eram donos de quatro hectares de terra, adquiriram mais seis, onde plantavam abacaxi e outras frutas, que eram vendidas por atravessadores, na Ceasa, em São Luís, com pouca margem de lucro. Essa diversificação melhorou os lucros, e a ideia de conhecerem Fortaleza, voltou.
Capacitaram alguns empregados e, com a ajuda do irmão, Augusto poderia se dar ao luxo de se afastar por alguns dias, para presentear a esposa com tão sonhado passeio. Seriam três dias de férias na cidade de seus sonhos. Comprou uma mala para o casal, roupas novas e, chegado o dia viajaram para Fortaleza, de ônibus, seis horas até São Luiz e mais 15 hora até Fortaleza, mas a expectativa era tamanha que não se importaram. A alegria deles explodiu quando estavam entrando na capital cearense. Chegaram já amanhecendo. Na rodoviária pegaram um táxi e solicitaram que os levassem a um hotel, que não fosse caro, desde que localizado próximo à beira-mar. Finalmente iriam conhecer o mar, que a avó do marido dizia ser um grande açude.
Acordaram cedo, tomaram café, vestiram roupas de praia e saíram rumo ao mar. Alegria e deslumbramento, realmente muito bonito, exclamou a esposa. Na praia almoçaram peixe frito e beberam água-de-coco. Voltaram para o hotel, descansaram um pouco e saíram novamente para conhecer a cidade. Foram ao centro, lotado de gente, ainda era sexta-feira. Compraram algumas bugigangas, olhavam com cuidado, tudo ficaria guardado nas suas memórias, para contarem aos filhos e, quem sabe, aos netos. Estavam deslumbrados. Cansados, voltaram para o hotel, antes jantaram em um pequeno restaurante, no caminho.
No dia seguinte foram ao Parque das Crianças, viram um roda-gigante de 60 metros de altura, foram experimentar a sensação que ela provoca durante um passeio. Outro deslumbramento, ver parte da cidade lá de cima. Acharam pouco as voltas dadas! A esposa ficou um pouco enjoada.
Durante o retorno ao hotel viram uma estrutura enorme, onde pessoas subiam por uma escada e, protegidos por um tapete, escorregavam até o chão. A curiosidade os impeliu em direção àquela geringonça. Estavam nervosos, mas todos desciam sorrindo ou gritando, não de medo, mas da sensação que experimentavam. Pagaram a entrada, subiram até o topo, receberam os tapetes e sentaram-se sobre eles. O funcionário explicou-os como proceder na descida: acomodar-se no tapete, juntar os pés, e ir descendo devagar. Essa última recomendação eles não chegaram a ouvir. Foram despencando ladeira abaixo, sem jeito, de pernas para cima, tentaram ajudar-se mutuamente, mas estavam indo rápido demais. As coisas só pioravam.
O marido estava de bermuda, sem problema. A esposa, de vestido, que, pela velocidade da descida, voava até a cabeça, deixando aparecer a sua roupa íntima, de tom avermelhado. A rapaziada, embaixo, na espera, aplaudia. As mulheres a criticarem a coitada da mulher, sem pudor, sem vergonha, só para se amostrar, falavam em coro. Os apupos eram ensurdecedores, misturados com as risadas e vaias, deixava o casal atordoado e sem saber o que fazer. O marido, ficou envergonhado pelo fato de a mulher ter se exposto daquele jeito.
E para saírem daquele ambiente foi um sufoco, o proprietário do tobogã fechou o acesso a eles, e pedia, por meio de um megafone, que as pessoas abrissem a passagem para o casal. Ela chorava muito e cobria sua cabeça com o tapete, o marido, de cabeça baixa enfrentou a pequena multidão, que aumentava cada vez mais, pela curiosidade dos passantes. De repente, parou um carro da polícia, três policiais desceram e colocaram ordem no local, permitindo que o casal saísse e entrasse na viatura da polícia. Rumaram para o hotel. No mesmo dia retornaram para a cidade deles, um tanto decepcionados por não terem conhecido Fortaleza.