A MARIPOSA NA PAREDE

Uma noite em meu apartamento entrou uma mariposa do tamanho de um morcego. Pregou-se na parede da cozinha e eu pensei logo em meus pais para me salvarem. Liguei para os dois e declarei o tamanho do meu medo. Mostrei o bicho na câmera do smartphone. Meu pai, muito falante, disse que quando era pequeno, na casa da minha bisavó no interior do estado do Piauí, dormiu com um morcego na parede do seu quarto e que não tinha porque eu ficar com medo, porque a mariposa não sugava sangue e estava ali porque entrara pela janela da cozinha e que amanhã de manhã a mariposa voltaria pelo mesmo caminho que entrara. Que eu fechasse a porta da cozinha e fosse dormir. Minha mãe também falou muitas coisas, entre elas chamar o zelador no dia seguinte para me salvar. Escutei todos os conselhos e, de repente, pensei: eu me basto. Ora, eu me basto. Foda-se. Meu nome é Paula Dantas e eu me basto. Tenho que resolver esse problema, porque eu já tenho 28 anos, moro sozinha e insetos invasores: mariposas, baratas americanas e porque não aranhas peludas e escorpiões vão aparecer a vida toda e eu não terei meus pais a vida toda para me ajudarem, nem que fossem para dar conselhos atabalhoados como ir dormir com um monstro na cozinha. Quem dorme com uma mariposa do tamanho de uma cafeteira estacionada na parede? Eu teria que resolver o problema sozinha. Agradeci aos conselhos, desliguei o smartphone, pensei e executei. Com todo cuidado apanhei a tigela de plástico transparente que eu usava no micro-ondas e sai da cozinha. Procurei entre os meus papéis uma folha de papel sulfite nova, bem lisa. Fui até a lavanderia, peguei a escada. E com todo o medo do mundo, encostei a escada na parede, subi até a altura da mariposa e fechei a monstra da parede dentro da tigela. Agora vinha a parte mais difícil, pois se a monstra se incomodasse, começaria a tentar voar, bater na tigela e eu não teria como aguentar tal situação muito tempo. Deslizei então a folha de papel sulfite pela parede entrei com o papel na tigela de plástico transparente, a folha chegou até a mariposa que, educadamente, deixou o papel passar por baixo dela e seguir até o outro lado da tigela. Quando terminei a operação, faltava outra parte difícil; segurar a mariposa no papel, e mantê-la imóvel na tigela, segurei o papel sulfite pelas bordas, retirei a monstra do seu local, pregada no sulfite, desci a escada devagar, fui até a janela da cozinha e soltei a mariposa dentro da noite.

Na hora do despejo da mariposa me deu uma saudade imensa. Lembrei dos meus pais e de como perdemos entes queridos no meio da noite. Podemos perder tudo e isso a mariposa me ensinou. Depois senti também um certo orgulho, pois resolvera sozinha um problema de origem selvagem. O último elo de medo que me ligava à infância quando atrás de cada porta poderia ter entre outras coisas, uma aranha com sua enorme teia instalada.

Não liguei para os meus pais contando a façanha. Fiquei na cama pensando no sucesso e na elaboração do meu plano tão perfeito e arriscado.