Indiscrição!
25.05.24
530
Às vezes, criamos situações inesperadas, que nos deixam em posição desagradável, de total desconforto, ou irremediáveis!
Foi o que me aconteceu outro dia. Fui encontrar amigo velho, que há muito não via, em um boteco que frequento há mais de trinta anos. Todos me conhecem por lá, inclusive sou amigo dos garçons. Um deles, mais novo no estabelecimento, nos atendeu naquele dia. É meu conhecido também de outras idas. Tem estatura mediana, magro, cabelos cortados rente, usa óculos de aros redondos e com algumas tatuagens nos braços, e nordestino, pelo seu sotaque característico. Simpático, solícito e de conversa boa, pois enquanto esperamos chegar os amigos, ou sozinhos, ficamos a palrar com eles, contamos nossos “causos” e eles os deles. É uma interação de cultura e costumes, típica dos botecos.
O amigo chegou, se sentou e começamos a conversar, contando ele como estava a sua vida e eu a minha. O garçom, postado em pé ao lado da nossa mesa, participava do papo. Em dado instante, o amigo me perguntou:
-Está morando em que local, agora?
-Ah, na rua abaixo do Shopping Frei Caneca, ou “gaycaneca” como dizem – respondi.
Meu amigo retrucou:
-Caramba Fernandinho, está saindo do armário nesta idade? – fazendo-nos rir, como ao garçom.
-Não, mas estou segurando a porta!
Rimos novamente. E, inesperadamente, o garçom nos disse de supetão:
-Eu sou gay!
Entreolhamo-nos, eu e o amigo, surpresos e demoramos alguns segundos para responder. Então, disse a ele:
-Está brincando né?
Ele tranquilo, com um leve sorriso nos lábios, puxou o celular e nos mostrou uma foto com o companheiro, deixando-nos desconfortáveis. Eu mais ainda, pois não imaginava que fosse gay. Nos contou que fora casado e teve um filho no Nordeste. Separou, e veio para São Paulo poder assumir a sua condição de gênero, pois lá seria muito difícil, inclusive na sua família, que nunca aceitaria.
-Desculpe-me a indiscrição.
-Fique tranquilo, sou profissional e não misturo as coisas e nem me abalo. Inclusive, aqui no bar, todos me chamam de “viadinho”!
Sem constrangimento, rimos os três.