O APOSTADOR
Vivia no sufoco, há anos, o aluguel para pagar, um quarto, sala, cozinha, eram três cômodos para seis se acomodarem, outro rebento a chegar, já não suportava mais tanto penar. Sonhava em um dia se libertar, então o que lhe restava era jogar. Juntava as moedinhas para apostar, em tudo que surgisse, jogo do bicho; mega-sena; loteca; loteria federal, briga de galo; bingo da igreja; carteado; roletas; jogos digitais; sinuca; bilhar; palitinho e outros jogos de azar, tudo o que viesse desde que tivesse o dinheiro para tentar.
Por um tempo tivera até o carnê do Baú da Felicidade, mas nunca terminava de pagar, daí nunca pode trocar por qualquer mercadoria.
Um dia, cansado de nunca ganhar, com poucas moedas uma rifa foi comprar. Faria uma boa ação e ainda seria abençoado, era em prol da igreja da matriz, na quermesse do padre Luiz.
Se contemplado fosse, teria algo para jantar, a prenda, um frango assado (uns apostam que é galinha) todo engordurado e farofa seca para acompanhar. Estava aflito, enjoado de ovo frito. Comprou três números com o pouco que tinha na carteira, desta vez seria aposta certeira, como em milhões de vezes pensara, nunca ganhara, sempre jogava em vão.
Pela primeira vez, depois de milhões de apostas finalmente acertara na mosca os algarismos, 13 – deu galo na cabeça – ganhou o dia, levou para casa a mulher do galo para à noite jantar.
– Ave Maria! – bradou.
Faria um banquete com a prole e a Dagmar. Comeria a se fartar como há muito não comia. Repartiu a guloseima, um frangote gélido de tanto esperar. Ficou com o osso da sorte, a fúrcula, aquele ossinho do galináceo em forma de “V”, pois acreditava, segundo a crença popular, que ao comer deveria fazer um pedido. Assim o fez, ele de um lado e, na outra extremidade, a patroa. Ao quebrar o osso, teve sorte, ficou com o maior pedaço e em voz alta fez o pedido. Momento solene.
Com o pedaço do ossinho à boca, emocionado gritou em alto e bom som:
– Aposto com quem quiser, adivinhem, o meu pedido é...
Tão afoito que estava, se engasgou com o fragmento, ficou roxinho de dar dó pela falta de ar, não demorou muito e, sem um suspiro sequer, faleceu. Quanto à farofa, até parece coisa de cinema, o vento levou.