Distraído

"Não deu tempo, andava muito distraido", disse a companheira com a voz embargada.

Há dias, ele descobriu um erro de métrica num poema de Robert Frost. Agora, com os dedos da mão direita, conta e reconta as sílabas, apoiando-os na própria perna. A conta não fecha. Bom, o erro só pode ser seu. Frost não erraria na métrica de seu próprio poema.

Um barulho o distrai de Frost. No outro lado da rua, na enorme praça, há um exercício de colégio militar. São adolescentes repetindo, em voz alta, ordens de comando do professor de educaçao física. Lembrou-se dos desfiles nazistas.

Curioso, cruza a avenida novimentada, quer ver de perto as expressões daqueles rostos e daquele que os comanda. Distraído, não observou a centopeia mecânica, ônibus de dois andares, carregado de turistas buliçosos.

- Andava muito distraído, comenta a viúva desconsolada.