Aventuras de Carlos Teixeira

No alto dos seus 1,64 m de altura, Carlos Teixeira, operário de uma fábrica de material de construção, prepara-se para mais um exaustivo dia de trabalho. Temperamento moderado, mas leviano em diversas ocasiões, estando sempre à mercê das críticas. Gordinho, mas não gordo bola, e sim um gordo moderado, de barriga que ainda a camiseta aguenta esconder a saliência. A pele parda dourada como o mel cobre a fisionomia. Os cabelos ralos mostram que a calvície, como escândalo público, denota sua lustrosa cabeça oval. Carrega diariamente sobre os ombros curtos, sacos de cimentos tão duros quanto a sua mania de economizar dinheiro; a dor nos ombros, mas não só neles, deu-lhe ao corpo diversas idas ao médico Almir.

O médico bonito, moreno, de olhar cerrado e sério, mas não tão sério quando avistava os seios de Joana, mulher de Carlos, de estatura bem acima do operário. Autoestima narcísica e uma leve arrogância sobre seus olhos tarados.

O supervisor do trabalho de Carlos semanas atrás deu-lhe uma ácida bronca por conta da molecagem que seus colegas aprontaram a ele:

— Anda, diz que foi você quem fez aquela merda lá!

— Não fui eu, jamais, senhor, jamais.

— O que você tem na cabeça, hã!? Gastar a nossa argila pra fazer uma puta rola gigante! — diz furioso — Se curte essas paradas, o problema é seu!

— Senhor, tô dizendo, não fui eu.

— Você sabe o quanto a gente gasta com material, caralho!?

— Algum pilantra armou pra mim, querem me ver fora daqui!

— “Fora daqui” digo eu, porra! Quase cinco anos de empresa e você manda uma dessa!

— O senhor sabe como é a turma aqui, eles sempre fazem gracinha, e…

— Ah, então eles querem te tirar daqui, e ao mesmo tempo é algo normal de acontecer?

— Só tô tentando dizer que eu não tive nada a ver com isso.

— O foda é que se eu te mandar pro RH, vão perceber que eu não estava de olho nas câmeras na hora — aprumou-se consciente o supervisor.

Um silêncio de segundos apoderou-se naquela sala. O supervisor em percebida contradição não viu outra saída: dispensou Carlos e avisou que em outra ocasião, a rua seria o seu mais novo rumo.

Nesse dia a raiva irascível tomou a esfera careca de Carlos. Ele saiu do trabalho chutando tudo o que encontrou rente à bota velha. Sentia-se despreparado para lidar com as adversidades das pessoas, nunca foi bom no “jogo de cintura”; como diziam os arcaicos em outra época. Lembrou-se da escola onde passava por esses mesmos infortúnios, além de seus rodeios à diretoria por ser um moleque falastrão. A garota que ele gostava certa vez acusou-o de ter arremessado uma bolinha de papel na professora; Carlos sem saber se defender, foi punido; tomou a maciez gostosa das réguas grossas sobre suas mãos. Quando chegou em casa, automaticamente seu pai puxou o chinelo e amaciou mais ainda o restante de seu corpo, que na época, era magro.

Caminhou até o ponto de ônibus, e sentiu a brisa fresca que deu o contraste daquele sentimento de cólera. Já em casa, expurgou toda a insatisfação do ocorrido para Joana. Ela, como esposa de décadas, apenas acalmou o marido, apesar das pífias provocações:

— Falei pra você se impor que nem homem!

— Show! Aí sou demitido e a gente fica complicado pra pagar as contas — ironiza o operário.

— Pelo menos eles iriam te respeitar, bobão…

— Genial, ô quenga — disse já sem ânimo para discussão — Fez a janta pelo menos?

— A empregada aqui fez, sim. Se sirva e seja feliz! — de braços cruzados e sem paciência ela responde.

Sem qualquer disponibilidade de diálogo, Carlos e Joana persistem nesse casamento falido. Joana é uma mulher de 37 anos, mas com o corpo e rosto de jovialidade clara. É de um temperamento pouco colérico, mas com a pitada de melancolia cansativa; reclama em demasia como uma velha cansada de tudo. Como a antítese a Carlos, é gastadeira, como se não houvesse amanhã — perfuma a si própria, se adorna com vestidos caros, e reclama do senso econômico do calvo operário. Ela tem cabelos longos e o rosto fino; com o busto firme e de pele macia, caminha feito Cinderela nas ruas por onde vai.

Hoje ao se preparar para o trabalho, a dor da coluna abarcou suas costas, por consequência, foi dispensado do serviço. Novamente visitou o médico Almir acompanhado de sua esposa, e lá recebeu o diagnóstico de uma lesão na coluna. O médico galanteador conversou por alguns minutos com a esposa de Carlos, enquanto um velho enxerido sentado ao lado o instigou com assuntos supérfluos, exauria a paciência que já pouco sustentava seu corpo torto:

— Opa! Tudo certo, macho?

— Tranquilo.

— O que houve com tua coluna, meu rei?

— Machuquei no trampo.

— Tu faz o quê?

— Sou pedreiro, por quê?

— Nada, não — Surpreso diz — Aquela é tua patroa?

— Infelizmente é — Quase rindo ele responde.

— Não é querendo me intrometer, não, mas esse médico que te atendeu é esquisitão.

— Também acho. Mas pelo menos ele dá uns atestados pra mim.

— Dá mais que isso, né não? — Com uma leve risada de um fumante ele diz.

— Quê? Como assim?

— Ele tá cantando sua mulher, men.

— Tá nada. Tá viajando, doidão? — Conspurcado encara o velho — Se tivesse, eu saberia.

— Olha o jeito que ele trata ela, e tu fica aqui só olhando.

— Dá licença, maluco!

Com uma leve incerteza no fundo, mas já cansado de tanto falatório em seus ouvidos, Carlos exclama o nome de Joana e ordena para irem embora. Já em casa, o pequeno operário, confuso e possuído por um ciúme nada assertivo, discute sobre o que o velho ao lado dele comentou. A amarga conversa que a cada vez mais se escalava, Joana via-se cansada daquele relacionamento. O pior infortúnio para o homem que além de sentir dor física, sentiria naquele instante, a dor emocional. Joana, sem escrúpulos algum, admitiu que adulterou Carlos três vezes, incluindo com o médico de olhos lascivos. Uma enquanto bebia com amigas, a outra na própria cama de casa, e a terceira quando o médico resolveu tratá-la mais doce que seu próprio marido. Ele a expulsou de casa, e os vizinhos puderam ouvir tais infâmias.

O tempo passou, assim como a dor na coluna. Voltou do afastamento, mas fora motivo de piadas dos colegas de trabalho. Um zombeteiro quando ele chegava à fábrica começava: “um Cornélio vem aí”; o coral das risadas nada empáticas tomava forma unívoca naquela empresa: “corno três vezes é música no Fantástico, Carlão”, outro pífio sujeito comentava. Há quem pense que isso terminou assim, mas pelo contrário, Carlos fora demitido por outra molecagem: alguém usou outra vez a argila, mas agora em uma espécie de capacete com chifres. Em suma, novamente fora acusado pelo supervisor de ter feito aquilo, mas agora com um leve deboche em seu sorriso. Seu comportamento à beira do colapso já não mais se explicava, deu uma bofetada em um funcionário despreparado por essa reação. Demitido por justa causa, na sarjeta de seus sentimentos, buscou outro emprego até encontrar, mas sempre quando se lembrava da sua impotência comportamental, mais triste ficava.No alto dos seus 1,64 m de altura, Carlos Teixeira, operário de uma fábrica de material de construção, prepara-se para mais um exaustivo dia de trabalho. Temperamento moderado, mas leviano em diversas ocasiões, estando sempre à mercê das críticas. Gordinho, mas não gordo bola, e sim um gordo moderado, de barriga que ainda a camiseta aguenta esconder a saliência. A pele parda dourada como o mel cobre a fisionomia. Os cabelos ralos mostram que a calvície, como escândalo público, denota sua lustrosa cabeça oval. Carrega diariamente sobre os ombros curtos, sacos de cimentos tão duros quanto a sua mania de economizar dinheiro; a dor nos ombros, mas não só neles, deu-lhe ao corpo diversas idas ao médico Almir.

O médico bonito, moreno, de olhar cerrado e sério, mas não tão sério quando avistava os seios de Joana, mulher de Carlos, de estatura bem acima do operário. Autoestima narcísica e uma leve arrogância sobre seus olhos tarados.

O supervisor do trabalho de Carlos semanas atrás deu-lhe uma ácida bronca por conta da molecagem que seus colegas aprontaram a ele:

— Anda, diz que foi você quem fez aquela merda lá!

— Não fui eu, jamais, senhor, jamais.

— O que você tem na cabeça, hã!? Gastar a nossa argila pra fazer uma puta rola gigante! — diz furioso — Se curte essas paradas, o problema é seu!

— Senhor, tô dizendo, não fui eu.

— Você sabe o quanto a gente gasta com material, caralho!?

— Algum pilantra armou pra mim, querem me ver fora daqui!

— “Fora daqui” digo eu, porra! Quase cinco anos de empresa e você manda uma dessa!

— O senhor sabe como é a turma aqui, eles sempre fazem gracinha, e…

— Ah, então eles querem te tirar daqui, e ao mesmo tempo é algo normal de acontecer?

— Só tô tentando dizer que eu não tive nada a ver com isso.

— O foda é que se eu te mandar pro RH, vão perceber que eu não estava de olho nas câmeras na hora — aprumou-se consciente o supervisor.

Um silêncio de segundos apoderou-se naquela sala. O supervisor em percebida contradição não viu outra saída: dispensou Carlos e avisou que em outra ocasião, a rua seria o seu mais novo rumo.

Nesse dia a raiva irascível tomou a esfera careca de Carlos. Ele saiu do trabalho chutando tudo o que encontrou rente à bota velha. Sentia-se despreparado para lidar com as adversidades das pessoas, nunca foi bom no “jogo de cintura”; como diziam os arcaicos em outra época. Lembrou-se da escola onde passava por esses mesmos infortúnios, além de seus rodeios à diretoria por ser um moleque falastrão. A garota que ele gostava certa vez acusou-o de ter arremessado uma bolinha de papel na professora; Carlos sem saber se defender, foi punido; tomou a maciez gostosa das réguas grossas sobre suas mãos. Quando chegou em casa, automaticamente seu pai puxou o chinelo e amaciou mais ainda o restante de seu corpo, que na época, era magro.

Caminhou até o ponto de ônibus, e sentiu a brisa fresca que deu o contraste daquele sentimento de cólera. Já em casa, expurgou toda a insatisfação do ocorrido para Joana. Ela, como esposa de décadas, apenas acalmou o marido, apesar das pífias provocações:

— Falei pra você se impor que nem homem!

— Show! Aí sou demitido e a gente fica complicado pra pagar as contas — ironiza o operário.

— Pelo menos eles iriam te respeitar, bobão…

— Genial, ô quenga — disse já sem ânimo para discussão — Fez a janta pelo menos?

— A empregada aqui fez, sim. Se sirva e seja feliz! — de braços cruzados e sem paciência ela responde.

Sem qualquer disponibilidade de diálogo, Carlos e Joana persistem nesse casamento falido. Joana é uma mulher de 37 anos, mas com o corpo e rosto de jovialidade clara. É de um temperamento pouco colérico, mas com a pitada de melancolia cansativa; reclama em demasia como uma velha cansada de tudo. Como a antítese a Carlos, é gastadeira, como se não houvesse amanhã — perfuma a si própria, se adorna com vestidos caros, e reclama do senso econômico do calvo operário. Ela tem cabelos longos e o rosto fino; com o busto firme e de pele macia, caminha feito Cinderela nas ruas por onde vai.

Hoje ao se preparar para o trabalho, a dor da coluna abarcou suas costas, por consequência, foi dispensado do serviço. Novamente visitou o médico Almir acompanhado de sua esposa, e lá recebeu o diagnóstico de uma lesão na coluna. O médico galanteador conversou por alguns minutos com a esposa de Carlos, enquanto um velho enxerido sentado ao lado o instigou com assuntos supérfluos, exauria a paciência que já pouco sustentava seu corpo torto:

— Opa! Tudo certo, macho?

— Tranquilo.

— O que houve com tua coluna, meu rei?

— Machuquei no trampo.

— Tu faz o quê?

— Sou pedreiro, por quê?

— Nada, não — Surpreso diz — Aquela é tua patroa?

— Infelizmente é — Quase rindo ele responde.

— Não é querendo me intrometer, não, mas esse médico que te atendeu é esquisitão.

— Também acho. Mas pelo menos ele dá uns atestados pra mim.

— Dá mais que isso, né não? — Com uma leve risada de um fumante ele diz.

— Quê? Como assim?

— Ele tá cantando sua mulher, men.

— Tá nada. Tá viajando, doidão? — Conspurcado encara o velho — Se tivesse, eu saberia.

— Olha o jeito que ele trata ela, e tu fica aqui só olhando.

— Dá licença, maluco!

Com uma leve incerteza no fundo, mas já cansado de tanto falatório em seus ouvidos, Carlos exclama o nome de Joana e ordena para irem embora. Já em casa, o pequeno operário, confuso e possuído por um ciúme nada assertivo, discute sobre o que o velho ao lado dele comentou. A amarga conversa que a cada vez mais se escalava, Joana via-se cansada daquele relacionamento. O pior infortúnio para o homem que além de sentir dor física, sentiria naquele instante, a dor emocional. Joana, sem escrúpulos algum, admitiu que adulterou Carlos três vezes, incluindo com o médico de olhos lascivos. Uma enquanto bebia com amigas, a outra na própria cama de casa, e a terceira quando o médico resolveu tratá-la mais doce que seu próprio marido. Ele a expulsou de casa, e os vizinhos puderam ouvir tais infâmias.

O tempo passou, assim como a dor na coluna. Voltou do afastamento, mas fora motivo de piadas dos colegas de trabalho. Um zombeteiro quando ele chegava à fábrica começava: “um Cornélio vem aí”; o coral das risadas nada empáticas tomava forma unívoca naquela empresa: “corno três vezes é música no Fantástico, Carlão”, outro pífio sujeito comentava. Há quem pense que isso terminou assim, mas pelo contrário, Carlos fora demitido por outra molecagem: alguém usou outra vez a argila, mas agora em uma espécie de capacete com chifres. Em suma, novamente fora acusado pelo supervisor de ter feito aquilo, mas agora com um leve deboche em seu sorriso. Seu comportamento à beira do colapso já não mais se explicava, deu uma bofetada em um funcionário despreparado por essa reação. Demitido por justa causa, na sarjeta de seus sentimentos, buscou outro emprego até encontrar, mas sempre quando se lembrava da sua impotência comportamental, mais triste ficava.

Reirazinho
Enviado por Reirazinho em 14/05/2024
Reeditado em 16/06/2024
Código do texto: T8063074
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