A gari
Cansada de varrer tanto a rua, voltou para o morro, a subida a cansava mais ainda. Ansiosa para ver seus filhinhos, levava o pão que comprou quentinho na padaria. A saudade dos meninos caminhava no peito junto com ela. Remava no andar pesado de um dia de muito sol e muito calor. O vento da noitinha bateu na face. Via as carinhas dos filhinhos. Para eles não seria invisível como era para todos os transeuntes das ruas que varria. Para eles era a pessoa mais importante. Por eles enfrentava essa vida dura e superava o desejo de abandonar tudo e todos. Somente a alegria de seus sorrisos compensava o sacrifício diário, a marmita fria, o calor, o sol, a chuva, a tristeza, as lágrimas, a vida passando como todo dia. Subiu o morro e à porta da casa da idosa vizinha soube que seus filhos dormiam, não os acordaria, a vizinha ajudaria a levá-los, não receberia o beijo e o abraço. Mas os corpos quentinhos dos filhinhos dormindo, porém, tendo certeza que a mãe voltaria para buscá-los a fez voltar a ficar feliz, esquecer o dia duro do trabalho. Tomou o café sozinha. Manuel, o companheiro, não estava. Estaria numa roda de viola, tomando umas bebidas com os amigos ou olhando para uma outra qualquer. Quando passou um tempo que havia tomado café banhou-se e deitou-se para descansar como uma pedra, os garotos dormiam. Quando dormia sentiu uma mão a lhe acariciar, eram as mãos de Manuel, meio bêbado a chamava para si; já um pouco refeita do cansaço, despertou e entregou-se a esse homem com muito prazer. Depois de participar do bom da vida com o amado, levantou-se, banhou-se de novo e abriu a janela. A lua entrou com todo seu brilho, redondinha, lustrosa e exibida. Linda, linda! Queria ser admirada, pois lá estava aquela mulher admirando-a. Lua, ela a fez feliz, deu mais uma nesga de felicidade, de cima do morro ela está mais perto, os filhos dormindo, o homem feliz e meio bêbado e a lua, longe e perto, linda! Uma canção ao longe também a fez feliz, mas veio o vento e era a hora de fechar a janela, então ela deu adeus para a lua, a veria no dia seguinte.
Rodison Roberto Santos
São Paulo, 03 de fevereiro de 2014