Casado em vinte anos

ELE

Meu casamento durou cinco anos, mas nesse tempo, descobri a felicidade de estar apaixonado. No fim, a paixão termina, só que o amor continua prevalecendo, transformando-se logo em suportáveis sutilezas.

Pois bem, a amada no começo é uma presa difícil. Em cinco perguntas, quatro delas é “não”. Contentando-se com o “sim“ que nos resta, levei-a para jantar. No começo, ela chega até que linda, senta, conversa, pra depois levá-la logo pra casa. Assim, aconteciam as saídas freqüentes sem beijos nem bochecha.

Não demorou muito para estar gostando da moça, porque não tinha nada melhor para se pensar naqueles dias. Aí, pra resumir a história bonita da minha vida, a gente se beijou depois de se conhecer em dois meses, sair em três semanas, para acabar na cama em dois anos. Claro, na cama, casados. Porque a garota era virgem.

Eu não sei como agüentei tanto tempo sem fazer o que é de necessidade de um homem, mas o amor... O amor é uma flor congelada no freezer pra conservar-se a beleza.

Com o desejo e o amor unidos no corpo, nossa lua-de-mel foi linda. E ela era criativa, queria agradar e eu que não sou bobo, ajeitava ela nas posições que queria.

Pelo menos, em três anos era assim. Beijos, amor, convivência, interesse... Mas depois, eu comecei a perceber as falhas, pois ela tinha manias estranhas que no começo parecia engraçado. Começando irritar a ela e a mim.

Crise no casamento ouvia dizer que era normal, só que eu e ela éramos temperamentais e orgulhosos, ficando dias sem nos falar. O desempenho na cama era uma droga, só pra ter uma idéia, a criatividade dela não passava de cinco minutos. Mesmo assim, eu era apaixonado, e olhava pra ela muitas noites enquanto dormia.

Passaram-se dez, quinze, vinte anos... A gente não se abraçava e nem beijava mais. As conversas eram tão curtas, que parecia que nos evitávamos. Em época de natal, por exemplo, a reunião familiar era boa. Mas ao passarmos um pelo outro, nem nos olhávamos. E apesar de não ser intencional, tudo se transformou em aceitações baratas e tristezas conjugais.

Foi hoje que abri a carteira e vi uma foto da minha amada e dos nossos filhos. A gente pensa tantas vezes em não se separar por causa dos meninos, que no fim, todas essas decisões ficam estagnadas. Só que o término deixaria tudo muito vazio, então propus a ela que a gente tentasse de novo ser feliz como se fosse à primeira vez.

ELA

Mulher tem que ser difícil. E eu não fui diferente. Já logo menti que era virgem para ser pedida em casamento. Ele... Achava-me criativa e nem suspeitava de onde veio tanta inovação.

A gente foi feliz, mas engravidei de um filho após o outro, e ele começou a me deixar cuidando dos meninos, sozinha. E pra descontar, deixava-o maluco durante uns cinco minutos e depois virava pro lado e dormia.

O que eu não imaginava, era que ele começaria a ter problemas com as minhas manias das quais já estava habituado, ocasioanando no final das contas, a brigas torpes. No fundo, era só uma contrapartida das vezes que eu dormia no ponto.

Só que se ele é temperamental, eu sou muito mais. E a gente ficava sem se falar a dias porque eu achava que era a única maneira dele se redimir comigo. A gente se falava por causa das crianças, não adiantando de nada o nosso pacto de silêncio.

Durou nosso romance uns dez anos, mas para ele, devem ter sido uns cinco. Só que por mulher ser mais sentimental, e de tanto ele se esforçar como pai, eu botava na conta, os anos de romance que eu acreditava termos vivido.

Nos dez anos seguintes, a única coisa que eu me lembro de bom, é de uma festa que ele me abraçou e disse que ainda me amava. Mas o que fez diferença foi ele ter me abraçado em casa sem estar bêbado e pedido pra gente tentar ser feliz de novo como se fosse pela primeira vez.