Talvez, adeus

_ O senhor quer morrer, vô? - perguntou o neto atônito sem saber o que fazer para aliviar as dores do avô.

Silêncio.

Não havia respostas, porque Ronaldo, o avô, não falava, não andava, nem dor sentia. Ele estava ocupando um espaço em sua casa que todos queriam que ele ocupasse, mas ninguém tinha condições de saber das vontades de Ronaldo que era pai e avó de muitos filhos e netos, bisnetos. Ele era um senhor de 88 anos, na verdade, faltavam alguns meses para completar quando o neto mais próximo o havia perguntado se ele queria morrer.

Não houve resposta, porque voz não havia. Todos estavam preocupados em ter a presença do pai-avô, mas poucos estavam dispostos a cuidar, dar carinho, atenção.

Cada dia que se passava, era mais nítido o quão debilitado ele andava. As filhas que se dedicavam, começavam a supor "eu acho que meu pai está perto de partir" dissera Lúcia, a filha mais próxima, ao neto que sempre estava por perto. O silêncio que pertencia a Ronaldo incomodava, agora, Igor, o neto querido que se dedicara quase integralmente a cuidar do avô, mas nada poderia ser feito, enquanto o fim se aproximava.

Trabalhar passou a ser uma tortura. À espera incansável por uma ligação e o medo de recebê-la. O sorriso, o compromisso e tudo o mais o que o tornava o homem que era, atormentava Igor de uma forma tão intrínseca que só ele era capaz de traduzir o barulho que fazia por dentro.

O dia em que ele decidiu perguntar ao avô se queria morrer, na verdade, ele já estava com a sensação da morte presente, não a morte física, mas a morte de um sentimento que nenhum dos que se preocupam em cuidar de seu Ronaldo deseja sentir, a dor do vazio quando ele se for.

Atravessar para o outro lado é a certeza de que todos deveriam ter, mas quem seria capaz de aceitar tão facilmente que o fim se aproximava? Viver estava sendo cansativo para aquela família, mas eles seguiam com fé, enquanto a morte não deseja chegar.

Gilson Azevedo
Enviado por Gilson Azevedo em 21/01/2024
Reeditado em 21/01/2024
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