A PROVA
Acordei gordo, mas fininho fobado. Espreguicei-me, expulsei gases sonolentos e limpei as remelas sob o espelho como um cão. Percebo que tenho prova de Matemática. “Eh, tenho que estudar!”, foquei-me. Já não escovei os dentes; ouvi à chegada da minha mãe, que comprou o matabicho.
— Tás a cartar água, Cavita?
— Certo, mamã, aproveito o tempo.
— Tipo vai chover, carta rápido, senão apanhas febre.
— Sim, farei rápido.
No sereno, ao carregar água, o braço palito levanta o balde, mas a força insuficiente funde como uma lâmpada estragada. Após isso, sento-me, coloco a mão direita sobre a mesa, onde a calculadora, o relógio, a esferográfica, o caderno e, principalmente, o exercício de função logarítmica, aguardam-me, talvez para me desafiar com dúvidas ou decorá-los de modo a não tirar zero.
Logo à frente, começa a chover, quer dizer, no Marçal quando chove, os sabores marçalinos ficam sem sal. E mesmo assim, o Prof. Terror, avisa por mensagem no grupo da turma: “Se chover, estranhem, mas saibam que, se parar, vocês farão a prova de Matemática!” Então, zangão, continuei a praticar o exercício mesmo não entendendo.
Horas depois, recebo a notícia de que a prova foi anulada, engoli felicidade e ao sair para observar o desenho da chuva, lanço gargalhadas como uma hiena.
O beco era um labirinto rio, a chuva roía a prova até à sobra. Encostado na porta, comendo pão seco, sem manteiga, mas com óleo, sem chá, mas com água não fervida, penso: “Fazer o quê, se o país está male?”
No beco, entre mastigar e mexer a boca como um comilão, pulava na água, com hábitos da infância, xingando sem parar a prova anulada. Parecia ser um lazer sem fim.