Mensagens
O filme Closer mostra o que acontece quando não conseguimos nos distanciar o suficiente das coisas para enxergá-las com maior clareza. É uma obra feita a partir de um olhar consciente e maduro, dirigida aos adultos responsáveis por suas ações, dispostos a deixarem o medo de lado.
Quando encontrei o meu amigo no bar ele estava pra baixo, duas ou três cervejas e seu olhar triste mataria uma planta.
-Que houve – disse sentando e pegando uma cerveja do balde.
-Seis anos nisso, sem eles – ele apertou os olhos e olhou para o meu cabelo recentemente pintado e disse -você está parecendo um deputado com esse cabelo pintado.
Paulo é um psicólogo que conheci no trabalho quando ainda clinicava em posto de saúde, um cara culto, bem humorado, lia bons livros, dez anos de casado com uma dupla, Gina e Léo, há seis anos Léo sumiu e Gina simplesmente terminou com Paulo por mensagem.
-Cansei de ser chamado de avô pelas crianças – passei a mão no cabelo recentemente pintado de preto e completei - quanto a Léo e Gina, você mesmo disse uma vez que fim é fim?
-É, eu disse essa bobagem pra você, sou o grande psicólogo sabe tudo – ele sorriu e ascendeu um cigarro – casa de ferreiro espeto é de pau, não é esse o ditado?
-É natal – eu disse - porque não faz uma viagem?
-Não quero, já tentei outros caras, outras meninas – ele suspirou – era o Léo que fazia as decorações de natal, então o natal pra mim acabou -ele me olhou – mas vamos mudar de assunto, e a sua filha?
-Vim te agradecer – disse.
-Funcionou?
Eu olhei para Paulo, ele não sabia o quanto é talentoso, me ajudou na aproximação com minha filha, apertei a mão dele e entreguei a garrafa de vinho.
-Para o natal.
Ele sorriu.
Nos abraçamos e antes de partir ele me falou.
-Me mostra a primeira mensagem que mandou pra ela.
Peguei o celular e mostrei.
“ Oi filha, sabe que acho você muito responsável, por estudar e trabalhar, seu avô estaria orgulhoso.” - ele correu os olhos pela resposta afetuosa de minha filha.
-A internet serve para alguma coisa - ele falou enquanto limpava as lágrimas.
Guardei o celular e disse:
-A dica que me deu sobre as mensagens foi genial.
Ele suspirou e pegou o iPhone última geração, abriu no aplicativo de mensagem e me mostrou:
-O Léo me tirou dos contatos, nem a foto dele aparece mais.
A última conversa entre os dois era de seis meses atrás, li a conversa, falavam sobre o filme Closer, discutiam sobre a possibilidade de uma sugestão homoafetiva naquele filme entre o Jude Law e Clive Owen.
-O amor é tão estranho – ele disse.
-Muito pouco racional - eu disse.
-Sexo é racional, amor é estranho, nunca é equilibrado, nunca proporcional, nunca vai embora, incomoda, a presença e a falta, desassossego, ás vezes quer matar e outras sente tanta falta da pessoa – ele disse – Léo era o meu amor, minha angústia.
-E Gina?
-Não sei – ele tragou o cigarro – O Léo queria ela por lá, de repente queria outros e outras também, passando o tempo em um relacionamento - ele tragou o cigarro passou a mão na testa tremendo, soprou a fumaça – você sabe? Quando só se quer sexo, nunca se tem o suficiente.
-Amor se faz na ausência da pessoa amada, talvez toda essa sacanagem do filme Closer demostre exatamente isso, coerência afetiva se dá na ausência, na presença é fácil – mudei de assunto e perguntei – vai passar o natal onde?
-Com minha mãe – ele jogou o cigarro fora – quem sabe naquela reunião falsa e maluca de família eu esqueça o meu drama.
Dei um tapa no ombro e disse “obrigado” mais uma vez.
Quando já ia andando Paulo gritou:
-Jota, Feliz Natal, sempre bom conversar com você, não me cobra, não me julga.
-Quem sou eu pra julgar, sou apaixonado pela mesma mulher há mais de vinte anos, tem coisa mais fora de moda que isso?
Ele riu como se estivesse um pouco aliviado:
-Também feio do jeito que você é – ele piscou pra mim – você sabe: ela é linda.
Paulo viajou para Austrália onde conheceu Fábio, seu novo amor, as vezes ele me manda uma mensagem.