Um homem estranho
Aconteceu comigo recentemente, num como qualquer outro. Eu estava em casa, trancado no quarto, ouvia musica muito alta (tava nem aí para o mundo). De repente ouço um estrondo na porta do meu quarto, que me assustou, como se alguém que estava em fuga tivesse chocado com a porta. Abri e era a minha irmã caçulê, tranquei e fiz olhar de poucos para ela...
- Porquê que bateste na porta desse jeito? - Perguntei com um tom de poucos amigos.
- Desculpa, pensei que se eu bater devagar você não ia ouvir...
- Eu não sou surdo - interrompi - fala então, o quê queres?
- Lá fora tem um moço...
- Um moço! É quem esse moço? Já apareceu aqui uma vez?
- Não...pediu p'ra chamar a mamã ou o mais velho que estiver em casa
- Como é que está vestido? - Insisti, com uma questão que mais tarde não vi sentido em tê-la feito.
- Está só assim...uma roupa...
- Só assim! - Percebi desdém na resposta dela e logo deduzi de que tipo de pessoa se tratava.
Caminhei até ao portão para o atender, vou dizer infelizmente não te posso ajudar porque nossa situação também está difícil, lamento imenso, e despacho isso logo, era assim que eu pensava. Abri o portão e entrei em êxtase ao deparar-me com aquela figura. Era um moribundo, quase que um cadáver ambulante, logo entendi porquê minha irmã bateu na porta daquele jeito, porquê aquele ar assustado e porquê não o conseguia descrever estava em choque, ainda mais do que eu estava.
- Boa tarde mano!
- Boa tarde! - Respondi e logo a seguir tirei os óculos, olhar claramente para aquela figura doía-me.
- Mano, eu sou - nem lhe percebi o nome, não sei se por causa do choque ou pela sua voz sôfrega, continuou - eu não como esses que andam aí a mentir, Deus sabe. Mano, eu já era bandido, eu roubava, mas Deus me ajudou e consegui sair do Hospital, mano, eu não tenho casa, eu vivo na mulola, se tapo lona, eu só pedo ajuda, não sei se vou chegar até o próximo ano, eu sou doente, tenho uma doença do estomago o médico do Hospital central disse para eu comer comida pesada, mas eu só como o que me dão. enho essa ferida na perna que o mano tá a ver - na verdade eu não enxergava a ferida porque tirei os óculos, mas acenei positivamente com a cabeça, continuou - tá podre, parece vão me amputar...mãe chama...vive no Namibe, pai é que não tenho, mano tou a te pedir, me ajuda só, o que me dares não para vender como fazem esses aí que depois vão beber...eu não bebo, o álcool já me fez muito mal, Deus tá me ver, e o pouco me dares Deus vai te recompensar.
- Desculpa mas...olha eu estou muito comovido com a tua situação mas...
- Não precisa ser comida, mano, - interrompeu ele - uma roupa que já não usam já ajuda.
Fiquei desconcertado, não via mesmo como ajudar aquele homem depois daquele discurso todo!
- Vou ver com que te posso ajudar.
- Muito obrigado, mano.
Voltei para dentro do quintal ainda pensando como ajudar aquele homem, não sei se era por comoção, remorso ou só queria evitar ''chatices''. Caminhei até a porta do meu quarto e parei, olhei para os meus irmãos que brincavam no quintal e pensei, talvez eu tenha casacos a mais, entrei no quarto, olhei para os pendurados no cabide, e descartei qualquer chance, puxei uma mala e deparei-me com umas calças jeans que eu achava já ter jogado fora a meses e ao lado um casaco que eu não vejo também já a muito tempo, que coincidência pensei. Peguei nos trapos e corri para fora do quintal, quando abri o portão o homem já não estava lá parado, foi-se embora depois de todo aquele discurso! Que homem mais estranho...!