Soberana Calma
Ela chegou em sua cidade natal depois de tantos anos.
Olhou a velha praça e não a reconheceu.
O que fizeram com aquele lugar onde ela foi tão feliz?
Onde chorou e sorriu, amou e sonhou?
O que ela fez de sua vida?
Sentou-se no banco da praça, o mesmo que assistiu tanta vida.
Ele continuava o mesmo. E ela? Transformações, vivências, amor e desamor.
Pessoas passavam apressadas.
Outras andavam devagar, talvez sem perspectivas.
O casal de namorados abraçados sonhava com o amor e vida plena.
Crianças brincavam. Ela lembrou que já foi criança um dia.
Não pensava no quanto era difícil e chato ser adulto.
Olhando aquelas crianças se viu criança. Queria sentir aquela alegria de criança.
Olhava as pessoas e parecia que ali não tinha mais nenhum conhecido.
Caminhou pela praça e se sentiu com dezoito anos.
Quantos sonhos, quanta fome de amor, quanta sede de vida.
Queria nunca ter saído de sua cidade.
Mas foi ao encontro de seu destino.
Trabalhar, amar, casar, ser feliz…
Ser feliz…
Lembrou Raul Seixas: “…pois ninguém nessa vida é feliz tendo amado uma vez…”
Talvez ele tivesse razão.
Talvez ninguém nessa vida seja feliz tendo amado uma, duas ou muitas vezes.
Ou será que apenas amou a pessoa errada?
Não sabia dizer.
Tantos anos de dedicação, amor, desejo de ser feliz, entrega.
E percebeu tarde demais que não valeu a pena.
Ingratidão, desrespeito, abusos emocionais e abandono.
Mas ela tentava se convencer que era o jeito dele amar.
Pensava que não conseguia viver sem ele.
Que no fundo ele era bom e que a solidão seria seu pior castigo.
Ela se afastou dos amigos, da família, deixou de frequentar festas e encontros.
Ele a queria só pra si. E ela, tola, pensava que isso era amor demais.
Ela caiu na real…
Percebeu que não merecia viver ao lado de quem a desprezava e humilhava.
Mas cadê coragem pra jogar tudo pro alto?
Onde estava a mulher forte e determinada que todos conheciam?
No fundo era só um poço de insegurança e medo.
Como viver sozinha depois de tantos anos?
Não. Ia se convencendo que ruim com ele, pior sem ele.
E a insatisfação só fazia crescer dentro dela.
Dizia pra si mesma que era uma mulher independente e que precisava se libertar.
Não podia mais viver assim tão humilhada e desprezada.
Sempre deixava a decisão para amanhã.
E mais uma gota d’água fez o copo transbordar…
Mesmo com muito medo decidiu ia embora com o medo e tudo.
Ali estava ela.
Livre das amarras de quem no fundo nunca a mereceu.
Estava insegura e nem sabia por onde começar…
Depois de chorar rios de lágrimas sentiu que nada sobrou daquele amor.
Sentiu que a melhor companhia que tinha era a sua.
E lá estava ela, de volta à sua cidade.
Decidiu que ali recomeçaria sua vida.
Vida de liberdade e respeito por si.
Encontraria novos amigos, novos sonhos, novos motivos pra sorrir e ser feliz.
E quem sabe encontraria um novo amor?
Maduro, verdadeiro, apaixonante, encantador…
Mas isso não era prioridade em sua vida.
Sua prioridade era ser livre e feliz.
O que só ela podia fazer por si.
Soberana calma tomou conta de seu coração…