A Mala da Vida
18.09.23
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Carregava sobre seus ombros uma enorme mala. Era um domingo de sol. Trajava roupas pesadas, de frio. Seu casaco era grosso e escuro e de cor indefinida, como a da sua calça. Os sapatos eram trapos. Alto e forte, tinha porte atlético. Mas a mala chamava a atenção pelo seu tamanho. Eu o acompanhava do outro lado da rua, caminhando também.
Cruzou ele com duas pessoas paradas na porta de uma casa, perguntando coisas sem nexo. Amedrontadas, pelos olhares medrosos que lhe davam, recuaram e deixaram passar aquele individuo estranho com sua enorme mala. Seguíamos no mesmo sentido, mas separados.
Chegamos a um cruzamento. Ele desceu a rua à direita com a enorme mala pousada em seus ombros largos e fortes. Eu segui em frente. Separamo-nos.
No caminho, depois de deixá-lo, comecei a pensar o que teria naquela enorme mala do forte homem maltrapilho. Talvez, seus poucos pertences para sobreviver na rua. Talvez, muitos papéis, latas ou plásticos que catara para vender por alguns trocados e comprar alguma comida. O que teria naquela enorme mala? – perguntava-me intrigado, andando.
Voltando, ainda curioso com o homem da enorme mala, no cruzamento em que nos separamos, decidi seguir o seu trajeto, descendo a rua.
Andei por alguns quarteirões e o encontrei debaixo da marquise de um edifício sentado com a enorme mala fechada ao seu lado.
Fui a ele. Olhou-me com olhos fundos e tristes. Suas feições eram rudes, trabalhadas pela dureza da vida que tinha. Não entendeu minha aproximação.
-Bom dia! – disse-lhe com tranquilidade.
-Bom dia moço! – respondeu-me com voz rouca e cansada.
-Vi você caminhando com esta enorme mala nos ombros e queria saber o que leva nela.
-Ah seu moço, carrego guardadinha, guardadinha dentro dela toda a minha vida. Assim ela não foge seu moço não é mesmo? Quando quero me lembrar, entro e me fecho nela e ficou lá revivendo aqueles momentos felizes, livres e gostosos que tive . Por isso a carrego sempre comigo, pois se perdê-la, minha vida se vai, não é seu moço? – sorrindo com sua boca totalmente desdentada.
Fiquei emocionado com o relato do pobre homem, dei-lhe dinheiro, que aceitou e despedi-me. Ele entrou na mala e começou a reviver seu passado, que o matinha vivo.