DESARRANJO INGRATO
Se tinha uma vida boa era a do Xico, assim mesmo com "X", não sabia o por quê desse apelido, uma vez que não se chamava Francisco, mas nem ligava, isso até evitava algumas situações, porque quase ninguém, além de sua família, sabia seu nome de verdade, eu nunca soube, mas sabia que não era Francisco. Ele era um cara boa praça, aposentado, também não sei de onde, mas não tinha uma pensão ruim, sei que todo dia chegava ao boteco por volta de onze horas, pedia uma cerveja bem gelada, um tira-gosto e ficava ali bebendo e conversando com todo mundo que chegava, com ele não tinha tempo ruim. Era aquele típico frequentador de boteco, sabia de tudo, conseguia solucionar tudo, além de ser um garanhão e se declarar muito esperto.
Todo dia tomava umas quatro cervejas sozinho, e ia embora perto de uma hora da tarde, não pendurava, pagava a conta no dinheiro. Dizia que ia almoçar, dar uma cochilada e depois à tarde "dar uma" na patroa para ela não precisar de outro.
Numa quarta-feira, não me esqueço, porque era o único dia em que minha patroa deixava eu ir ao boteco no meio da semana, o Xico não parou lá, foi direto para casa, eu até pensei que ele estava doente e procurei saber com a turma, ninguém sabia e todos também estranharam. Uns minutinhos depois ouvimos cinco ou seis estampidos surdos, vindo da casa do Xico, e em seguida os vizinhos começaram a gritar, apareceu polícia, ambulância e rabecão, três corpos foram postos nele.
Ficamos sabendo, no velório, que o Xico, justo naquele dia, precisou ir em casa, pois estava apertado para ir ao banheiro, desarranjo intestinal, nesse caso especial ninguém fazia no boteco. Ao entrar em casa, apressado, pegou a sua mulher na cama com um sujeito que ninguém conhecia. As bocas malditas da rua disseram que sabendo dos horários rígidos do Xico, a patroa recebia em casa um rapaz que conheceu na aulas de tricô que frequentava, religiosamente às quintas-feiras, na igreja. O boteco, depois desse fato, fechou, sem clientes, e o curso de tricô acabou.