Ah!, como eu admirava a sapiência de dona Ana, uma mulher de hábitos simples, que me cativou pela sua educação e carinho com todos à sua volta. Eu costumava me sentar ao seu lado, no batente de sua casa, onde ela gostava de ficar nos fins de tarde. Ali eu deitava minha cabeça no seu colo e ficava ouvindo as histórias que ela contava. Eram histórias curtas, alegres e continham mensagens inteligentes. Todos os dias eu pensava num tema sobre o qual tinha curiosidade e corria para perguntar a dona Ana, pois tinha convicção de que a resposta me seria dada por meio de um conto fabuloso, com finais surpreendentes e instigantes. Às vezes, ela contava causos divertidos. Porém, ela evitava falar sobre mortes ou desastres. Havia dias em que era possível ver, no olhar de dona Ana, uma certa nostalgia; parecia que ela tinha um segredo ou algo que não gostava de se lembrar e que a incomodava.
Mesmo na ingenuidade de minha infância, eu percebia que ela era a protagonista na maioria das suas histórias, ou seja, mesmo citando personagens nos seus enredos, ficava subentendido que ela estava dentro da história, principalmente daquelas em que erros ou fracassos serviam de lições, de aprendizagem, e que ela fazia questão de ensinar com sua criativa metodologia.
É fato que algumas das minhas curiosidades surgiam das leituras nos livros sugeridos pela escola. Um dia perguntei se ela gostava de ler. Dona Ana acariciou meus cabelos, e com sua voz suave, disse: Minha menina, só podemos gostar daquilo que se prova. Infelizmente, eu não tive esse prazer, pois nasci e cresci na zona rural, lá não tinha escola nem livros na época, de modo que apenas aprendi a escrever meu nome. Surpresa, eu insisti e a questionei: – E como a senhora sabe tantas coisas, dona Ana? Ela respondeu: Ah, minha filha, aprendi lendo nas entrelinhas da vida.
Iêda Chaves Freitas
18.07.2023
Tema da semana: Dentro da história