Magnétika- cap. 13
Magnétika- cap. 13
Na semana seguinte as coisas já tinham se aquietado; continuava convivendo com a família; batia longos papos com Seu Jô, quer dizer, ele falava de seus livros; a toda hora chegavam amigos para bater papo, dele e de Dona Zulmira, que sempre oferecia algum prato ou petisco.. O que dissera era verdade: quando experimentamos o dar, o receber vem logo em seguida, de outro jeito, outra hora, por outra pessoa. Não vou nem falar de minha família; eu os amo, com todos os defeitos, mas...ali as pessoas pareciam estátuas ou... cheias de exibição e pedantismo.
Mas, deixa pra lá... encontrava Gabrielle; ela sorria para mim, eu idem; já tinha outro namorado e nem fazia caso disso. Estava sempre perfumada e bem arrumada. Encontrava os outros filhos; Ivã também; entrava batendo as portas, mal me cumprimentava, sentava e Dona Zulmira servia a sopa ou o que quer que tivesse.
-Você tomou o remédio?- ela dizia timidamente.
Ele resmungava qualquer coisa, limpava a boca e saía novamente num ímpeto.
Ela parecia preocupada e desesperada, mas procurava não demonstrar
-Não ligue, ele é assim mesmo...
Pensei um instante e depois tomei coragem de lhe falar:
-Seus filhos são incríveis, mas...tão diferentes entre si...
Ela me olhou, depois baixou o rosto e os óculos e continuou mexendo a sopa.
Continuei:
- Eu diria que não parecem filhos de você e seu Jô...
Era como se lhe desse uma punhalada. Parou de mexer por um instante. Tomou um gole d´água. Depois confessou:
-São...São filhos do coração. E e seu Jô nunca pudemos ter...Víamos as crianças de pessoas boas, mas sem condições; íamos ficando, falávamos que eram nossas. Os pais ainda nos visitam; não querem de volta, pois sabem que somos honestos e bons. E depois, a papelada seria complicada; aqui na comunidade ninguém nunca denunciou; só uma moça, justamente a mãe da Gabrielle; ela era tão pequenininha e fofa; eu me encantei na hora... Mas depois a mãe, que não tinha juízo, queria levá-la de qualquer jeito. Eu falei: "quando tiver dezoito anos ela escolhe se quer viver com você". Depois disso seus olhos se encheram de lágrimas e soluços. Abracei-a como se fosse minha mãe e... tinha sido como, de certa forma.
Mas não resisti e perguntei:
- E o Ivã?
Ela caiu sobre a cadeira:
-Esse é complicado...os pais eram músicos e trabalhavam na noite. Eu me encarreguei de cuidar da criança desde pequena. O marido caía nas bebedeiras e a mãe também; a casa deles era uma confusão de instrumentos, partituras, letras, misturado com roupas, panelas. Nunca que uma criança viveria lá. Ivã sofreu muito; por isso ta,vez seja um jovem revoltado.
Fiquei estupefato, mas... já desconfiava.