Histórias que gosto de contar – Câmera indiscreta
Gilberto Carvalho Pereira – Fortaleza, CE, 27 de junho de 2023
Uma tarde tranquila naquele sábado. Pouca gente se movimentando no edifício residencial de 28 andares, três elevadores. Os porteiros, tranquilamente, exerciam suas tarefas de vigilância, sem muito atendimento. Algumas crianças e adolescentes usavam as duas piscinas. Depois das 14 horas é proibido fazer barulho, principalmente, com ferramentas de construção, o que é normal em residencial de alto luxo. No edifício em questão, uma profusão de câmeras de segurança encontra-se instaladas por todas as áreas comuns, até, e, principalmente, nos elevadores.
Naquele dia de tranquilidade, dois adolescentes, um garoto e uma garota passeavam de elevador, entre os 28 andares, brincadeira inocente! Não foram perturbados pela vigilância que, despreocupados, não atentaram para as travessuras dos dois. Eles subiam e desciam, trocando de elevador ao final de cada subida e descida. Depois de um certo tempo, dados por satisfeitos, e cansados daquela brincadeira, foram para a piscina, juntando-se aos outros que lá se encontravam. Chegaram rindo e os outros queriam saber o que estava acontecendo com os dois, que continuaram rindo e não responderam. Os amigos ficaram indignados e se afastaram deles.
No último movimento de descida do elevador, um morador, ao entrar, percebeu que todos os botões de chamada tinham sido acionados. O homem que estava com pressa, morador do 28º andar, ficou furioso. Saiu do elevador no andar seguinte e, pelas escadas, foi até ao térreo falar com os porteiros. Esbravejando, e gesticulando muito solicitou que precisava saber quem havia utilizado o elevador social, recentemente. Marivaldo, um dos porteiros, informou que as duas últimas pessoas que haviam saído do ascensor – querendo impressionar – foram duas crianças, na verdade, dois pré-adolescentes, o menino do 21º andar e a garota do 22º andar.
Mais que depressa, o senhor Lorenzo, o queixoso, italiano, bastante chateado, foi para o seu apartamento, interfonou para o apartamento 2201, avisou para quem atendeu que gostaria de falar com o senhor Klaus. Esse, de origem alemã, uma pessoa truculenta, briguenta, desafeto do Lorenzo, informou para quem atendera o interfone, não ter nada para falar com senhor do 2801. Foi o estopim de uma nova guerra entre os dois. O genovês foi ao apartamento do alemão azedo, era assim que ele chamava o senhor Klaus, tocou a campainha várias vezes, até ser atendido. De cara amarrada e esbravejando muito, o homem, hidrófobo, abriu a porta e asperamente, perguntou:
─ O que o senhor deseja, veio tirar o meu sossego?
─ Vim apenas informar que sua filha, por traquinagem, apertou todos os sensores do elevador. – disse o genovês, espumando de raiva.
─ Como você sabe que foi ela?
─ O senhor Marivaldo, o porteiro.
─ Não acredito, esse subalterno já tem encrenca comigo, ele vai perder o emprego! – falou o homem que acabara de ser perturbado em sua soneca dos sábados depois do almoço.
Preocupado com o emprego do eficiente porteiro, de onze anos de casa, o senhor Lorenzo, tentando acalmar o ferino do apartamento 2201, propôs irem até a portaria, verificar as câmeras dos elevadores, no que foi aceito. Ao chegarem à portaria, solicitaram que o HD do computador fosse acessado, para que pudessem consultar as filmagens daquela tarde. O que foi feito.
Quando as imagens que interessavam apareceram na tela do computador, mostravam os dois adolescentes, o garoto do apartamento 2101, de 14 anos de idade e a garota do 2201, de 13 anos de idade, acionando todos os sensores do elevador social. A máquina subia do térreo ao 28º andar descendo em seguida, por três vezes. Em cada parada, eles se abraçavam, contando vitória pelo feito.
Na última parada já no térreo, o garoto segurou a menina pela cintura, levantou-a até que as suas bocas ficassem no mesmo nível. Abraçados, um beijo demorado aconteceu. O pai da garota, não suportando aquelas cenas, pediu para apagarem aquelas imagens, e exclamou: ─ não quero ver mais nada!
Já quase chorando e sem mais aquela atitude de brutamonte, o homem pediu desculpa ao seu vizinho, e, delicadamente, falou para os dois porteiros que estavam ali, nunca comentarem o que ali viram. Em seguida dirigiu-se ao elevador e cabisbaixo retornou ao seu apartamento, na certeza de que ninguém mais ficaria sabendo do acontecido. Confiava na discrição e bom senso do vizinho e no medo dos porteiros em serem dispensados do trabalho.