Cadê o menino?

A casa deles ficava no começo da descida do morro da Tabatinga (ou no fim da subida???).

Palmira e Onofre do Zico tinham doze filhos. Sete meninos e cinco meninas. E com a diferença de idade bem pouca entre um e outro.

Enquanto Palmira, um tanto "fraquinha das idéia", vivia às voltas com a meninada, com o de comer e com o roupeiro pra lavar, esperando a noite pra poder namorar o Onofre, ele saia de casa bem cedo, montado num caminhãozinho verde "cara chata" e ia fazer carreto de leite. Buscava nas fazendas e entregava na Nestlé.

Num dia de domingo, depois do carreto, juntou a meninada mais a mulher, pôs todos no caminhãozinho e foram pros matos passear. Catar gabiroba e cagaita. Cerrado é cheio desses trem. A meninada pulou na carroceria e Palmira subiu na boleia, toda pimpona, com Maria das Graças, José Antônio e Natalino, as três crianças mais novas.

Passaram a tarde apanhando as frutinhas, arranhando as pernas nos ramos, comendo a matula, chupando laranja e achando a vida u'a bondade.

Cinco horas, o pai e a mãe juntaram a prole, ah, pai, só mais um tiquin, Onofre contou, nove na carroceria e tres na boleia, tudo certo, e rumaram pra cidade. A gritaria e a risaiada lá atrás era coisa de doido. Uns em pé, falando alto, outros deitados no assoalho do caminhão olhando o céu. Um fuá. E num instantinho chegaram na cidade. Pai e mãe apearam com os pequenos e os outros foram pulando da carroceria. De repente, Palmira olhou "praquela" ruma de filhos e sentiu uma pontada no estômago. Ou na cabeça. Ou no peito. Ou três pontadas. Só se sabe que os vizinhos ouviram um Onoooofre do céu e um grito bem gritado: falta um, gente! Cadê o menino?!?!?! Choro, grito e ranger de dentes. O jeito que tinha era voltar lá nos mato e procurar o Geraldinho. Minha Nossa Senhora, vai escurecer! Alma Santa do Padre Libério, ajuda nóis! Uns dois ou três homens da vizinhança subiram na boleia do "cara chata" e foram também, ajudar na procura do desgarrado. Palmira ficou em casa

mais os meninos. Ela chorava, com o peito na boca do filho mais novinho, fazia promessa pra Nossa Senhora do Rosário e de vez em quando xingava os maiores por não saberem cadê o menino. Uma tribuzana.

O caminhãozinho lá ia. Onofre, com um nó na goela, prometia pra algum santo que se achasse o Geraldinho são e salvo nunca mais poria um cigarro na boca. Já tinham rodado uns quinze minutos quando o Branco deu o sinal. Ali, ali, parece que tem alguém ali sentado no barranco. Onofre apertou os olhos e também viu. É ele, gente, é o Geraldinho! Parou o caminhão, apearam e correram. O Geraldinho quando viu o pai desatou a chorar. De alívio, de medo ou dor no braço, vai saber. O que aconteceu foi que ele estava meio separado dos irmãos, sentado na beirada da boleia. O caminhão passou por baixo de uns galhos, ele pendurou num deles com as duas mãos, o galho quebrou,ele se desequilibrou, caiu da boleia e ninguém viu. Onofre dirigiu pra cidade, passaram na Santa Casa, o Dr. João encanou o braço do menino, fez um curativo na testa, passou iodo nos arranhões e pronto. O que eu sei é que Onofre parou de fumar, Palmira, enquanto deu conta de caminhar, carregou a bandeira de Nossa Senhora nas Festas do Rosário e Geraldinho cresceu, se casou e se mudou pro Goiás.

Desirée Santiago
Enviado por Desirée Santiago em 20/06/2023
Reeditado em 15/10/2023
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