Amigo Augusto dos Anjos

Augusto de Carvalho Rodrigues dos Anjos.

Um amigo distante. Ontem resolveu me visitar. Chegou sem avisar e como todo bom amigo, avisar são formalidades desnecessárias. São filigranas que ofuscam a beleza da própria visita.

Augusto não fala muito. É detentor de uma figura quase soturna. Não ri muito. É amigo do silêncio e forte candidato à solidão. Porém, quem conhece Augusto, sabe, é pessoa por demais sensível. Gosta de escrever poemas e não se envaidece quando elogiado. É um amigo leal às amizades; jamais agiria às escondidas.

Augusto escreve lindos poemas. É direto na intenção de clarear a fala com palavras livres e sem rodeio. Dialogar com o amigo Augusto, não é tarefa difícil. Ser direto evita qualquer possibilidade de mal- entendido. Para Augusto, ser direto, é sinal de sabedoria e lealdade.

Nossa primeira conversa, há algum tempo, começou com um simples acenar de cabeça, em seguida, trocamos impressões sobre a prisão de um sujeito conhecido na região e assíduo cliente da casa de Tereza. Num bar invadido por meretrizes e fracassados homens e pequenos comerciantes, naquela noite não se falava outra coisa senão da prisão. Falar da vida alheia, quase sempre, abre espaço para falar dos infortúnios da própria vida. O bar cheirava a gordura queimada e gente sem banho. O garçom, um velho picarrento, indicava suspeita de tuberculose. Sujeito magro e olhos profundos suscitaca, toda vez que tossia, um esforço profundo dos pulmões, parecia que respirar, tanto quanto caminhar (ele puxava de uma das pernas), exigia demasiado esforço.

Augusto nada dizia. Era um observador acostumado às horas altas da noite fria, vez ou outra, como quem anuncia o próprio fim, sussurrava um quase lamento. Fumava e bebia como se o dia seguinte fosse uma promessa tão distante que a cada gole, sorvia o ardente líquido como se bebesse o mundo.

"A rua do destino dos desgraçados, faz medo", disse ao ver Tereza, a rainha das meretrizes, das ruas escuras, depositárias das fealdades e sonhos frustados, sonhos rompidos e corrompidos. Ruas de infâncias irrealizadas. Ruas dos amores sofridos, ruas sifilicas. Tereza, loira, boca vermelha e carnuda, era A Mãe das meretrizes mais jovens e muitas até inexperientes. Cuidava de cada filha como se legitima fosse. Levava ao médico ou ao cemitério; Tereza cuidava em todos os sentidos.

Eu e Augusto. Dois estranhos amigos distantes, conversamos por toda noite. Uma noite sem Tereza e suas filhas. O garçom sumiu do bar. O pequeno comerciante da casa de manteiga, fechou a loja e seguiu a jovem recém chegada meretriz. Tereza não vai cuidar dela. Geraldão, nome fictício de Lindalva, assumiu o negócio.

A noite avança. A sífilis também.