1972. Jorge dirige seu corcel amarelo novinho, recem comprado, pela avenida atlântica e para em frente ao Copacabana Palace. Desce e fica admirando o infinito do mar. Recebeu uma carta de Cássio, seu amigo de infância e ele já está em segurança no Chile. Conseguiu fugir do governo militar.

          Quando estudavam no ultimo ano do colégio Pedro II, os militares deram um golpe e destituiram João Goulart da presidência do Brasil, assumindo o poder, que só devolveriam 21 anos depois. Jorge pragmático e ambicioso, Cássio, idealista e sonhador, seguiram rumos completamente diferentes. Cássio engajou-se na luta para restaurar a democracia e Jorge entrou na faculdade, estudou economia e rapidamente subiu na vida. Com o comprometimento cada vez mais profundo de Cássio na luta passaram, a se encontrar cada vez menos. Algumas vezes Jorge encontrou os pais de Cássio abatidos por não conseguirem notícias do filho e ficava triste por também não ter nenhuma notícia para dar. Algumas vezes sentiu raiva do amigo.

          Há dois meses atrás, andando pelo centro da cidade, quase desmaiou ao ver um cartaz com a foto do amigo sendo procurado como terrorista. Sentiu pela primeira vez que o Brasil estava realmente vivendo uma ditadura. Cássio não era um terrorista, apenas queria um mundo mais justo e melhor para todos. Sempre esteve disposto a acolher quem necessitava de ajuda. Sentou em um banco e chorou enquanto os momentos que passou com o amigo desde a a infância passavam pela sua cabeça. Ao voltar para casa, já tarde da noite, foi abordado por um Cássio assustado pedindo ajuda para se esconder. Jorge achou que era hora de sua luta começar, abraçou o amigo e resolveu ajudá-lo, escondendo-o em sua própria casa até que ele conseguisse fugir do país.

          Depois de um mês, levou o amigo às 5 horas da manhã até uma estrada deserta, onde ele entrou em um caminhão que o levaria até o Chile. Trocaram um abraço longo, demorado e Jorge disse que sentia muito orgulho dele e que o amava muito: Amizade é para toda a vida Cássio. Observando o mar onde tantas vezes eles tomaram banho, Jorge ao reler a carta pela terceira vez falou em voz alta: um dia você vai poder voltar para o seu país meu amigo.

 

          Em 28 de agosto de 1979 o presidente João Figueiredo assinou a lei da anistia preparando caminho para o fim da ditadura. Os exilados puderam então voltar para o Brasil e Cássio retornou no dia 13 de dezembro. No aeroporto os dois trocaram um abraço e choraram. Jorge parou seu landau na frente do copacabana palace, os dois tomaram uma cerveja e comeram uma galinha ao molho pardo como nos velhos tempos. Em 1988 Cássio lançou pela editora de Jorge um livro relatando sua luta e seu exilio. O livro ficou 22 semanas na lista dos mais vendidos da revista veja e virou uma serie de televisão.

 

José Raimundo Marques
Enviado por José Raimundo Marques em 09/05/2023
Reeditado em 10/05/2023
Código do texto: T7784206
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2023. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.