O relato de uma mãe idosa

Você vai envelhecer um dia. Isso é claro! Mas quando me falaram isso eu ainda era bem jovem. Não entendi naquele momento o verdadeiro significado do envelhecer. Mesmo porque eu tinha tantas coisas a fazer e a resolver que nem me preocupei em dar ouvidos a este assunto. Eu trabalhava na época como ajudante de pintor de paredes. E naquele tempo, o pintor, meu patrão, pegou um prédio para fazer todos os serviços de pinturas. Eu era o ajudante! Lembro bem que ficamos ali fazendo os trabalhos de pinturas por uns dois meses. Era o prédio do Asilo de Idosos do Município e que ficava um pouco distante da Cidade ali quase na saída do trevo que ligava a rodovia. Foram dois meses de convivência diária com todas as pessoas que ali estavam morando ou trabalhando nos cuidados diários com os idosos. Nos primeiros dias foram difíceis para eu aceitar o trabalho naquele lugar. Se me permitem dizer foi um tanto constrangedor e até emocionante estar em um Asilo. Eu começava por volta das oito horas da manhã e ia até às dezessete horas. A cozinheira, merendeira e a faxineira logo pela manhã me chamavam para tomar café com os idosos. De início eu ficava meio de canto e um tanto cismado de tomar café ali na cozinha do asilo e junto com aqueles idosos. Com o passar dos dias fui me enturmando e até conversando e escutando as histórias daquele idosos.

"Minha filha por que você me colocou neste asilo ?

Mamãe você, hoje, está em uma cadeira de rodas. Eu tenho mil e uma coisas a fazer e a resolver. Não dá para eu cuidar da senhora. Eu não tenho tempo! Como é que eu posso ficar lhe empurrando na cadeira de rodas pra lá e pra cá o dia inteiro?

Minha filha, quando você nasceu, você também não andava, e eu te carregava no colo o tempo todo. Eu também tinha mil e uma coisas pra fazer. Cuidar e tomar conta dos seus irmãos. Levantar cedo. Fazer o café, em seguida fazer o almoço e a tarde o jantar. Também tinha que lavar louças, limpar a casa, lavar roupas, passar roupas e ainda tinha que cuidar do seu pai entre tantas coisas. Depois que você começou a andar os cuidados aumentaram. Eu tinha que ficar olhando em cada canto de casa, para ver o que estava fazendo. Depois veio a fase da escola. Eu te levava e trazia você todos os dias. E lá em casa cheio de coisas para fazer. E coloquei você em colégio pago. Eu precisava lavar roupas para fora para inteirar para pagar o melhor colégio para você estudar e sempre pensando no melhor para você. E quando veio a sua fase da faculdade, lembra, além das roupas, eu fazia salgadinho para vender nos botequins, pois era cara a faculdade, mas trabalhava muito, para você ser alguém na vida e ter um diploma. O que eu, sua mãe, nunca tive, mas isso não me desonra. A pensão do seu pai era pouca. Eu me desdobrava em três , para sua faculdade para nunca o pagamento atrasar. Aí você se formou, casou e saiu de casa, e pouco vinha me visitar. Hoje adoeci, fiquei nesta cadeira de rodas. Realmente ficou difícil em casa me movimentar.

A sua solução foi esta né minha filha, me colocar neste lugar. Onde quase ninguém vem me ver, nem mesmo poucos minutos para conversar. É a vida minha filha mas, muitas coisas ainda vai aprender.

Só peço a Deus que seus filhos na sua velhice trate de você. Que não lhe levem para o lugar do abandono. Para nenhum asilo ou casa de repouso para você não sofrer de solidão. Vai em paz minha filha e que Deus a proteja! Dê um beijo nos meus netos que você ainda não os trouxe para eu conhecer..."

Benedito José Rodrigues
Enviado por Benedito José Rodrigues em 04/05/2023
Reeditado em 05/05/2023
Código do texto: T7779885
Classificação de conteúdo: seguro