A Caçada
29.04.23
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Ficava a espreita, inerte como uma estátua, no pé do muro no jardim da casa . Teso! Seus olhos fulgurosos e fixos acompanhavam as futuras presas, os pássaros. Vinham comer a ração que o dono da casa colocava todas as manhãs ali no topo da construção.
Havia também, fincado no gramado em um suporte alto, uma casinha de madeira aberta nas laterais para alimentar os bem-te-vis, joões-de-barro e gralhas. Pássaros maiores e mais suculentos, mas difíceis de abater.
Mantinha-se parado e quieto, mexendo de vez em quando a cabeça e as orelhas, pronto para o bote. Avaliava a situação a cada segundo. Era um caçador instintivo - sua índole indomável.
Os menores, canarinhos da terra, rolinhas, pardais aglomeravam-se em cima do muro brigando pela quirera de milho, sem saber que poderiam ser a qualquer momento pegos por ele - o gato da casa!
Os maiores, bem-te-vis, joões-de-barro entravam e saíam da casinha beliscando a ração para gatos, sua comida, que seu dono dava a eles. Se os pegasse, seria sua vingança.
Então, um joão-de-barro inadvertidamente desceu ao gramado, com seu andar característico de balançar a cabecinha para frente e para trás, ciscando insetos.
- É agora! – pensou o gato tencionando mais ainda os músculos das patas, com o olhar fixo no pássaro pronto para abocanhá-lo.
Arrastando-se como uma cobra foi se aproximando cuidadosamente do desavisado joão. A ave não percebeu o perigo, pois estava de costas para o bichano.
Então, com movimentos suaves e coordenados, pulou agilmente sobre o pássaro, e com uma das patas deu-lhe um tapa certeiro. Abateu-o e abocanhou-o inerte, morto talvez.
O caçador saiu com a presa na boca em direção à porta da casa, para mostrar sua façanha ao dono. Este, em pé no portal da entrada da residência, acompanhou toda a cena. Sabia da característica predadora do gato e não o inibia.
Chegando aos pés do homem, soltou o João- de-barro aparentemente morto. O pássaro, desesperado, voou imediatamente para longe, soltando muitas penas e gritos apavorados. Nasceu de novo.
Não se abalou com a fuga da sua caça. Olhou para o homem como se nada tivesse acontecido e foi caminhando mansa e lentamente para o ensolarado piso da garagem, deitando-se preguiçosamente ao sol.
Nesse dia, o joão foi mais esperto que ele.