Cortes da Chiquita
Eram encantadores, verdadeiras obras de arte. Tão delicados. Tão trabalhados. Feitos à luz de lamparina, nas noites de lua cheia, o céu bordado de estrelas e ela a bordar sonhos. Era menina ainda, dos meus cinco a seis anos. Sempre ganhava vestidos lindos de organdi, rodados, fitas de cetim, das primas de São Paulo, Londrina. Eram o máximo. De princesa. Mas minha mãe tinha lá suas habilidades artesanais, curiosidade, criatividade e muito bom gosto. Queria confeccionar ela própria um vestido para filha caçula ir às missas de domingo na Igrejinha de madeira surrada do Patrimonio Regina. Ou na linda Catedrall neo-gótica de Londrina. Com a ideia na cachola, não descansou enquanto meu pai não foi à cidade e trouxe das Pernambucanas o tecido; era um tecido rústico, de algodão azul petróleo..., homem lá entende de cores de criança... minha mãe logo logo arranjou um jeito de deixá-lo delicado, mimoso.Fez bordado de rococó intercalado com flores brancas de sianinhas e nervuras, em toda sua saia . Na cintura, um laço gracioso, dava o toque final. Verdadeira obra de arte . De vitrine. Alta costura.Galeria Lafayette de Paris . De fazer inveja ao corte infantil de Coco Chanel. Inspirada no canto dos pássaros, nas margaridas brancas do jardim, no assovio do vento , na Ave Maria de Gounot no alto-falante da capela, na brisa mansa da tarde que caía doce e gentilmente, para dar espaço às estrelas brilhantes do céu ... ah a Dona Chica, amassava barro, colhia café, mas tinha alma sensível de poeta, e sua arte era pura, como as águas das minas cujo canto fazia-nos adormecer e sonhar.