O Que O Olho Não Vê O Coração Não Sente

Ela sai da casa e vê de longe o novo jardineiro trabalhando. Fica observando. É um homem jovem aparentando uns trinta anos. Forte, alto. Está com uma camiseta que deixa notar seus músculos. Tem um rosto bonito. Sorri e conversa com as plantas. Aparenta tranquilidade e felicidade.

Ela pensa que ele é um homem pobre, mas vive feliz, talvez.

Pensa em sua vida de milionária. Uma vida sem graça. Casada com um homem doze anos mais velho, ela não se sentia realizada. Desde que se casou há dezesseis anos ela nunca foi plenamente feliz. Sempre sentiu que faltava algo em sua vida.

Conheceu Alexandre em uma festa e logo se apaixonou. As famílias aprovaram o namoro pois achavam que seria vantajoso unir os negócios e as fortunas.

Era filha única e recebeu a mais esmerada educação e formação. Ele era um homem gentil e apaixonado e prometeu que daria a ela uma vida de rainha.

Mas o que é uma vida de rainha? - ela pensava agora.

Casou jovem, aos vinte anos, como ainda era comum no início da década de 1960.

Teve dois filhos que estavam com quatorze e onze anos.

Tinha tudo o que uma mulher pode sonhar em ter.

Tinha uma vida social agitada acompanhando o marido em todos os grandes eventos e acontecimentos sociais. Mas se sentia entediada com os assuntos, exibições e futilidades dessas ocasiões.

Foi andando e se aproximou dele.

-Bom dia! Você é o novo jardineiro, não é?

-Sim.

-Qual o seu nome?

-Pedro. A senhora é a patroa?

-Sim. Eu me chamo Ana Lúcia. Não me chame de senhora, por favor.

-Espero que goste de meu trabalho

Abriu seu sorriso largo e ela observou a beleza do seu sorriso, dos seus dentes e dos seus grandes olhos castanhos que pareciam sorrir também. Era um homem rústico, pele queimada pelo sol, mãos calejadas, cabelos maltratados. Mas ainda assim era bonito.

Ela teve um ímpeto de tocá-lo pra ver se todos aqueles músculos eram reais.

Se conteve.

Ele colheu uma linda rosa vermelha e lhe entregou.

Ela vendo aquele símbolo de paixão sendo ofertado por ele, teve pensamentos libidinosos e imaginou como aquele homem poderia dar prazer a uma mulher.

Fugindo, ela se despediu dele e entrou.

Da janela do seu quarto ficou observando ele trabalhar e sentiu seu corpo arder de vontade. Nunca havia sentido nada igual.

Ela foi tomar um banho morno pra apagar o fogo que lhe consumia.

Há muito não sentia prazer com seu marido que podia ser tudo menos um bom amante. Se contentava com uma dieta trivial quando na verdade ela sonhava com um banquete com o qual pudesse se deliciar e delirar de êxtase. Muitas vezes ela sentia seu corpo arder de vontades não satisfeitas.

Sabia que seu marido era apaixonado e fiel e não entendia como um homem pode se contentar com tão pouco. Ele demonstrava gostar muito mais dos negócios, das rodas sociais e de jogar tênis que de sexo. Pensava que ele tinha orgasmos mais intensos com um bom negócio, com uma vitória no tênis ou com colunas sociais que com ela.

Conversava com suas amigas sobre suas insatisfações e elas ficavam horrorizadas e diziam que um casamento é assim mesmo e que uma mulher de respeito não pode se dar ao desfrute.

Ela não concordava com estas idéias e achava que uma mulher de respeito é uma mulher como outra qualquer com as mesmas necessidades e vontades.

Naquela noite ela ainda sentia seu corpo arder e se ofereceu ao marido que serviu o mesmo arroz com feijão de sempre. Ela queria muito mais.

No dia seguinte ela foi passear pelo jardim com uma roupa provocante.

Pedro a olhou de cima a baixo.

Ela foi conversar com ele e se mostrava para chamar sua atenção.

-Você é casado?

-Não. Sou solteiro. Vim do interior para tentar estudar e este emprego é muito bom pra mim pois tenho um alojamento pra ficar.

-Quantos anos você tem?

-Trinta e um.

Ele a devorava com os olhos. Tentava disfarçar. Mas ela percebia e se mostrava.

Ela era uma mulher muito bonita e tinha um corpo lindo.

Dia após dia eles conversavam e ela o observava de sua janela. Ela o provocava e ele tentava se manter indiferente.

Num sábado à tarde Alexandre saiu com os filhos para jogar tênis, os outros empregados da casa já tinham saído para a sua folga. Só a cozinheira estava na cozinha preparando o jantar.

Ana Lúcia saiu e foi até o quarto de Pedro.

Ele abriu. Estava sem camisa e ficou constrangido com a presença dela.

-Precisa de mim? Quer que eu faça algum serviço?

-Preciso.

Tocou seu tórax musculoso e bem definido.

Ele se afastou pensando em não procurar problema pra si.

-Por que foge? Sei que você quer.

-Eu sou um simples empregado da casa, eu devo respeito à senhora.

-Já pedi pra não me chamar de senhora.

Foi se aproximando dele, entrando no quarto.

-Por favor, eu não quero problema nem com você e nem com o patrão, mas eu não sou de ferro. Não me provoque assim.

-Não quero seu respeito. Quero seu corpo.

-Você não pode estar falando sério. Eu não estou à altura de uma mulher como você.

-Não quero que esteja à minha altura. Quero que satisfaça meus desejos.

Ela se aproximou mais dele e o beijou. E ele não pensou em mais nada.

Ela colou seu corpo no dele e sentiu todo o desejo que ele também sentia. Ele tocou seu corpo com a ousadia de quem sabe o que faz e quer. Tocou seus seios e murmurou em seu ouvido:

-Você tem uma pele tão suave, delicada e macia que tenho medo de machucar com minhas mãos grossas.

-Toque-me, machuque, faça o que quiser, mas faça eu me sentir uma mulher plena e saciada.

Ele a deitou em sua cama de lençóis rústicos, mas ela nem sentiu. Só sentia o toque dele a que a deixava alucinada.

E ele satisfez o desejo dela mostrando como um homem pode fazer uma mulher se sentir em êxtase.

Ela ficou um tempo nos braços dele. Depois se vestiu. Beijou de leve a boca dele que ainda permanecia deitado.

-Eu já vou. Mas eu volto.

Ele sorriu, levantou da cama, abraçou Ana Lúcia e se despediu.

Mais tarde seu marido e seus filhos chegaram animados pelas vitórias no jogo.

Ela os recebeu com carinho. Seus olhos brilhavam e ela se sentia leve

À noite foi pra cama com seu marido e pensava na tarde ardente que teve com Pedro.

E ela continuou vivendo seu caso com Pedro. Não sentia culpa pois pensava que se o marido lhe desse o que queria não precisava procurar lá fora. Amava Alexandre, mas queria os prazeres que ele não conseguia lhe dar.

E vivia sua dieta frugal com o marido e se fartava em banquetes com Pedro.

O tempo passou. Quando Pedro se formou e encontrou outro emprego Ana Lúcia convenceu Alexandre a deixá-lo continuar morando em seus aposentos até que melhorasse de vida.

E por anos ela continuou o caso com Pedro. Seus filhos cresceram, formaram, casaram.

Tempos depois Alexandre faleceu.

Mas nada mudou entre ela e Pedro. Nunca assumiu seu caso com ele, mas também não fazia mais questão de esconder.

Compromisso era coisa sem importância.

Para eles só o que importava era arder de desejo, era o prazer.

Nádia Gonçalves
Enviado por Nádia Gonçalves em 08/01/2023
Reeditado em 08/01/2023
Código do texto: T7689563
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