Passarinho Come Muito; Gato Come Pouco

23.12.22

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Todas as manhãs me aguardam empoleirados na cerca de madeira do muro da frente da nossa casa. São joões-de-barro, aqui têm muitos, rolinhas, canários da terra, pardais, todos em grande número. Os bem-te-vis são poucos, mas, os mais barulhentos.

Ansiosos, esperam que lhes dê a ração do meu gato, pois adoram. Um detalhe: o sabor é de frango. Não sabia dessa peculiaridade dos pássaros daqui. Eles se empanturram com as bolinhas, trinando ou guinchando de agradecimento. Fico feliz em acompanhar a algazarra que fazem.

Esta curiosidade inesperada descobri em uma manhã em que um joão-de-barro caminhando com seu andar caraterístico e sem medo algum do nosso bichano, veio ao prato de comida do gato e bicou as bolinhas da ração que sobraram. Fiquei atônito com a ousadia do pequenino e do seu apetite esquisito, pois passou pelo nosso gato dormindo ao sol sem qualquer cerimônia.

Pássaros comem ração? Esta eu não sabia, pensei.

Então, para testar, resolvi colocar um pouco dela sobre o topo do muro junto da entrada da garagem, para que comessem em segurança, pois o nosso gato, como todo felino, é por natureza caçador. “Vira e mexe” aparece um passarinho morto na grama do jardim ou o coitado é trazido inerte e frio até a porta da entrada. Ele o traz para nos mostrar sua façanha. É da sua natureza.

Antes desse inédito acontecimento havíamos colocado, no gramado junto ao muro, em um pedestal, uma casinha de madeira para alimentar pássaros, e até então, nada que lá se punha os apetecia: eles são exigentes.

Agora, com os punhados de ração postos todos os dias, a casa fica abarrotada e caótica com o entra e sai deles, devorando tudo em minutos. É uma festa.

Então, em um dia chuvoso, pois aqui tem chovido dias e dias seguidos, estava eu deitado na rede, na garagem, olhando distraído o cair pesado da água, quando ouvi os piados altos e típicos de um casal de bem-te-vis.

Da rede acompanhei o vai e vem entre a casinha e a árvore que temos na calçada, na qual estava um filhote. Ele tinha um piado diferente e quando os pais vinham para lhe dar comida guinchava forte e batia as asas freneticamente. Vi que o pai e a mãe se dividiam e escutei outro piado de filhote: eram dois, para minha surpresa.

Os pequenos, empoleirados nos galhos da árvore, abrigavam-se da forte carga d’água que caía, enquanto os pais voavam encharcados para alimentá-los, independentemente da força da chuva. Não se importavam, pois suas penas impermeáveis os mantinham secos e quentes - é uma vantagem que a natureza lhes deu.

Intrigado vi, através das folhagens da árvore, que os filhotes eram quase do tamanho dos adultos. Desci da rede, peguei o guarda-chuva e fui me aproximando devagar para observá-los. Realmente eram do mesmo tamanho e poderiam muito bem ir buscar o seu próprio alimento. Muito comodismo dos pequenos, pensei.

Passei a tarde acompanhando o cuidado dos pais para com os filhotes, colocando inclusive um pouco mais de ração no muro e na casinha.

Agora, todas as manhãs bem cedo, a família bem-te-vi com seu piado característico me aguarda pedindo o café da manhã. Vale a pena alimentá-los e ver a sua gratidão, bem como a dos outros comedores de ração. É prazeroso.

E quem disse que passarinho não come? Come e muito! Haja ração!

Pois hoje em dia a ração é mais para eles do que para o próprio gato, que come como um passarinho, pouco.

Feliz Natal e Ótimo 2023!

Fernando Ceravolo
Enviado por Fernando Ceravolo em 22/12/2022
Código do texto: T7677900
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