TE AMO, CHUVA! - BVIW
O fenômeno da chuva era um transtorno quando eu era criança, pois atrapalhava meus planos de brincar no terreiro. Antes de ter um quintal, morava em BH, e do segundo andar do prédio sentia uma doce melancolia de ver os pinguinhos de chuva na janela de vidro. Os carros passavam e faziam “chuáááá” e disso eu gostava, tanto do barulho como da água espirrando pra todo lado. E depois que me mudei para o interior, ou melhor, me mudaram - porque criança acompanha seus pais - eu simplesmente odiava os dias de chuva. Naquele tempo, chovia “dias enfiado” e era um tédio ficar dentro de casa, vendo o lodo tomar conta do terreiro, pintando-o de verde. Além do mais, o céu de chumbo me deprimia. A chuva era bem-vinda somente quando ia passar as férias na fazenda do tio Zé Vitória, porque a molecada fazia coisas inimagináveis no barro visguento das terras de Luz. Chafurdávamos que nem porcos, escorregando na lama de um dos currais de terra batida. As crianças se agarravam na porteira e uma delas abria a taramela, para a porteira jogar com força a criançada curral abaixo, entre gritos e risadas. Depois que cresci e mudei-me para BH a fim de estudar, a chuva ainda continuou sendo um transtorno para mim. A cidade grande ficava enfurecida quando chovia, o trânsito se transformava num pandemônio e era um suplício sair de casa pra trabalhar e estudar. Um dia, um colega de trabalho me disse que amava a chuva! Achei estapafúrdio alguém jovem gostar de chuva! Só no entardecer da minha vida, me apaixonei por ela! A cantilena das goteiras no telhado, a enxurrada nas sarjas, o véu de noiva no horizonte, o cheiro da “petrichor”, a algazarra dos pássaros alvoroçadíssimos com a chuva, os coriscos e seus trovões, tudo isso me dá imenso prazer. É claro que os desastres por causa da chuva, como os deslizamentos nas encostas, deixam-me com o coração partido. Esses são os espinhos do jardim florido que é a vida. O resto é só flor de chuva!
Cassiå Cāryn̈e