Alergia a Alface
19.12.22
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É uma menina esperta, vivaz, alegre, falante e agitada. Precoce em seus três anos de idade. Hoje as crianças o são com suas tiradas e falas imprevisíveis. Ela é minha neta “postiça”, filha da minha enteada, mas a considero como neta de fato. Cecilia é o seu nome, para nós, Ciça. E me chama de “Nono”.
Bem, o fato aconteceu meses atrás em uma ida a Porto Alegre, onde moram, para consulta médica da “Oma”, avó em alemão, e visitá-los.
Combinamos de almoçar em um restaurante perto da casa deles, um bufê muito bom e com preço acessível. Era um sábado quente, pois a capital gaúcha é tórrida, faz um calor tremendo.
Chegamos, e antes, brincamos eu e Ciça com uma estátua de madeira, em tamanho real, de uma mucama baiana que tem bem na entrada do bufê. A estátua mexe os braços, fico, então, por trás dela imitando uma voz feminina perguntando:
-Bom dia menina, tudo bem? Qual é seu nome?
-Ciça – responde de sorriso largo, franzindo seus olhinhos azuis.
-Vais comer bastante hoje para ficar forte?
-Sim! – responde, enquanto as outras crianças riem da brincadeira e com as quais também brinco.
Sentamos em uma mesa grande, éramos quatro adultos mais a Ciça – ela no cadeirão. A mãe e o pai foram fazer o prato. Eu e minha mulher ficamos com ela, entretidos com suas conversas “deliciosas”.
A mãe voltou com um prato com legumes, carne, arroz, feijão e salada de alface, e disse para a filha ao se sentar:
-Olha, aqui tem um pouquinho de tudo do que você gosta. Tem carne, brócolis, cenoura, arroz, feijão e salada de alface – disse colocando o prato de comida em frente à menina.
-Humm, que delícia, hein Ciça, que belo prato! – falei para ela.
Com o garfo desajeitadamente em uma das mãos e com a ajuda da outra pegou um pedaço de carne e começou a mastigá-lo. Foi separando em um canto do seu prato, a alface dos demais alimentos.
A mãe vendo o que a menina fazia, perguntou:
-Você não quer a alface que tanto gosta, como os dinossauros, que são grandes e fortes por que a comem?
Ciça manteve a concentração no que fazia e disse suspirando:
-Tenho alergia à alface.
Entreolhamo-nos atônitos pela resposta, pois ao invés de dizer que não gosta ou que não queria comê-la, veio com essa fala esperta, já que sua mãe disse que esse alimento é importante.
Não me contive e comecei a rir. Ela, mantendo-se séria, disse-me franzindo o cenho:
-Nono, é verdade! Me dá bolinhas aqui e coçam. Olha! - disse-me ela mostrando seu bracinho liso com algumas sardas.
Muito esperta mesmo essa menina!