SIM, PESADELOS EXISTEM
Vim até aqui para que possamos conversar um pouquinho. Na verdade, a palavra é
minha, então creio que será um monólogo, mas não se preocupe, não será chato.
Tentarei também ser breve.
Assim que você senta diante de seu computador, digita na barra de pesquisa o nome
RECANTO DAS LETRAS, clica em TEXTOS, em seguida opta pela categoria
CONTOS e logo depois decide ler algo COTIDIANO, creio que esteja procurando por
algo leve.
Afinal, nosso cotidiano nos remete a tranquilidade, um pouco de estresse, trabalho,
trânsito e passeio no parque. Muitas vezes ao lado deste parque algum idoso sofre
um infarto e você apenas observa a agitação das pessoas. Talvez até corra até lá para
tentar ajudar ou apenas para ver… o que me traz ao nosso assunto de hoje.
Meu codinome aqui neste site é COTIDIANO SOMBRIO. Você pode entrar nele,
estão todos convidados, mas, precisa saber onde está se metendo.
Se minha página fosse uma construção cercada, certamente haveria uma placa
pendurada na entrada com o símbolo de uma caveira. É um local perigoso, porém
você pode entrar se prometer não tocar em nada.
A ideia de criar uma página dessas em uma categoria que teoricamente não engloba
temas tenebrosos, me surgiu dias atrás enquanto escrevia uma história. Me ocorreu o
quanto nosso cotidiano pode ser cruel algumas vezes, mostrando-se fatal,
deprimente e perverso.
Você pode discordar (embora acredite que sua sensatez esteja em dia), e agora pode
inclusive sair deste texto, me achar um imbecil e até mesmo deixar um comentário
com sua opinião sem ao menos ler o conteúdo completo. A escolha é sua e em
hipótese alguma vou obrigar você a nada. A vida possui dois hemisférios e eles são os
seguintes:
O bem e o mal. Inevitavelmente eles vão se cruzar algumas vezes, queira você ou não,
tente evitar ou não.
A morte de um ente querido é um ponto inevitável, por exemplo, não há um meio de
você frear essa etapa. Lhe resta sofrer, lidar com aquilo da melhor forma possível,
abraçar o luto por um tempo ou para sempre. Quando algo assim acontece, sua vida é
coberta por um manto escuro, é como se o mundo se tornasse cinza e sorrir é
simplesmente um gesto que ficou no passado. É sobre isso que gosto de falar em
minhas histórias. Sobre a realidade das pessoas, por mais sombrias que elas possam
ser.
Você encontra com o seu vizinho praticamente todos os dias, o cumprimenta, o
enxerga jogando o lixo fora pelas manhãs e, em algum momento da vida descobre
que naqueles sacos de lixo existiam restos humanos.
A notícia faz você ficar chocado, e este choque de realidade lhe causa medo. O medo
faz parte da vida e — lamento informar — está por toda parte. Não há remédio para
ele.
Isso porque o medo é traiçoeiro, ele sabe como pegar você pelo cangote, porque sente
o cheiro de sua fraqueza. Não é apenas algo da infância. Quando era criança, meu
medo era precisar levantar no meio da noite para ir até o banheiro. Porra, existia algo
mais cruel do que aquilo?
Levantar, andar por um corredor escuro até chegar diante da porta. As possibilidades
de acontecer uma merda eram inúmeras. Meu tornozelo poderia ser agarrado assim
que pusesse um dos pés no chão; um vulto mais escuro que o próprio escuro poderia
surgir diante de meus olhos, sem precisar me tocar, apenas cruzar por mim já seria o
suficiente para que fizesse tudo nas calças.
Essa percepção do medo, do que ele é capaz de causar, é o que me fascina. Há quem
diga que não possui medo de nada. Para estes corajosos, eu digo: e se a sua esposa
revela estar grávida? E se ela completar os nove meses de uma forma perfeita, mas,
durante o parto, existirem complicações?
Então o médico irá chamar você até uma sala separada e dizer: não sei como isso irá
acabar! Podemos tentar salvar os dois… ou apenas um. Talvez nem isso.
Então sua coragem faz as malas e te abandona. Agora é apenas você e o medo, rapaz.
E posso te adiantar que ele vai vencer fácil.
O medo do desconhecido também faz parte de nosso cotidiano. Não saber
exatamente o que está te fazendo ficar angustiado é algo horrível. Você procura um
motivo e tudo que encontra são mais perguntas.
Este medo, essa sensação, se assemelha bastante com aquele pavor de precisar ir até
o banheiro na infância que citei anteriormente. Nisso você já é um adulto e começa a
tremer como uma criança. O desconhecido habita a nossa mente, faz ela desenhar os
piores cenários possíveis para o que está por vir. O medo da morte causa bastante
esse tipo de sensação. Afinal, ninguém quer ir para o inferno sambar na frigideira do
Diabo. Ou, talvez, o medo se concentre em não encontrar quem amamos do lado de
lá.
Seja qual for o motivo de nossa preocupação, ela existe, é um fato, está em nosso
cotidiano à espreita.
Há também a possibilidade de nosso medo ser apenas algo psicológico e, porra, esses
são perversos! Não há inimigo maior do que aquele que vive em nossas mentes. De
todo modo, consegue perceber como estamos cercados por coisas terríveis?
Que podemos ir até a padaria e ao invés de encontrarmos pães no forno, existir um
bebê lá dentro?
Que nossa carona pode ser a última?
Você pode pensar: por Deus, esse sujeito só pensa em coisas negativas!
Daí lhe respondo: você está certo. Essa talvez seja a principal diferença entre um
autor de terror para outros gêneros.
Você olha para uma praça em uma tarde de sol e enxerga felicidade. Eu enxergo
outras possibilidades e pode acreditar que todas são ruins.
Uma criança pode cair de um brinquedo e quebrar o pescoço. Um maluco pode puxar
uma faca e sair cortando as pessoas, ensandecido.
Agora, pensar nessas coisas não significa que as encaro dessa forma. Estamos
falando de CONTAR HISTÓRIAS, de criar situações. A criatividade de um autor de
terror (a mente de um), precisa ter esse Norte esquisito.
Se o seu cotidiano é visto de um jeito pacífico, as pessoas vão ler você para se sentir
bem, para sorrir e refletir. Já comigo, elas também poderão refletir e perceber que a
vida não é feita apenas de sol e alegria. Às vezes chegam tempestades fortes.
A próxima pergunta que provavelmente poderá lhe ocorrer (se é que já não ocorreu),
é a seguinte:
Se quer contar histórias tenebrosas, porque não usa o gênero terror aqui do site para
fazer isso?
Certo, vamos lá. A resposta poderá parecer confusa, mas creio que irá entender o
meu raciocínio.
Histórias tenebrosas que acontecem em nosso cotidiano, precisam ser vistas por
diversos ângulos. O gênero COTIDIANO é perfeitamente capaz de abordar essas
histórias. É o que chamei de choque de realidade. Esse tipo específico de história, em
que algo ruim acontece de repente com alguém, é o que costumo chamar de “história
possível”.
Ou seja, ela pode acontecer (infelizmente), com qualquer um de nós. Mesmo algo
sobrenatural?
Sim, sem dúvidas. Só que essas onde o surreal aparece, ao meu ver, se encaixam
melhor no gênero TERROR. Compreende o ponto?
Já frequentei a página de Terror inúmeras vezes, e posso garantir que o número de
leituras que você recebe por lá é muito maior do que aqui, em COTIDIANO. Só que
não estou à procura de quantidade de leituras, e sim do espaço certo.
Se o sujeito abre a página de TERROR, dificilmente ele irá querer ver algumas
histórias que tenho, pois elas não te assustam da forma que este sujeito quer ser
assustado. Às vezes, este sujeito quer ver apenas sangue ou lobisomens peludos. Essa
linha é bastante tênue, mas você consegue respeitá-la desde que entenda como ela
funciona.
Se estou postando pesadelos por aqui, é porque sei que eles existem e que as pessoas
os compreendem quando fecham os olhos. O choque de realidade que poderá sentir
assim que terminar uma dessas histórias, não é nada além disso; um chacoalhão.
Existem diversas opções além de mim para serem lidas aqui nessa página, basta
fechar a minha e seguir adiante. Para minha grata surpresa, a recepção dessas
histórias têm sido ótimas por aqui, o que comprova o meu ponto. Confesso que no
início da iniciativa senti um tremendo receio, mas isso terminou assim que li os
primeiros comentários que recebi.
Portanto, encare essa visita como uma ida até a montanha russa; você sabe que
sentirá um frio na barriga, até mesmo um certo desespero, mas, também sabe que
logo aquilo irá passar.
Você pode até me dizer: cara, nem sempre é assim. Fiquei com aquela história na
minha cabeça dias depois!
Por essa razão, peço desculpas. Mas, sabe como é: de vez em quando somos capazes
de lembrar de nossos pesadelos mesmo depois que acordamos.