CATA OSSO

CATA OSSO

ESTORIA DE COBRADOR

Dinheiro passa em minhas mãos o dia inteiro, mas o que adianta não é meu, é do patrão.

Patrão que me paga no final do mês o que ele chega ganhar em uma hora, fico triste, indignado quem manda não estudar.

Acordo de madrugada na hora do melhor sono costela quente, de minha nega o cheiro suave de sua pele macia.

Penso até em desistir de trabalhar, inventa uma doença, quem sabe uma dor de cabeça, ou até mesmo uma dor de barriga só para ficar em casa.

A consciência pesa nesta hora aparecem os quens, quem vai pagar as contas no final do mês, quem vai dar leite aos bacuris não tem jeito, já ganho pouco não posso pensar em falta tenho que ir.

Pego minha roupa encima da tabua de passar, minha nega reclama segura em meu braço, tenta puxar para cima da cama a tentação ou sono até penso em ficar.

Lá vem a consciência de novo dou uns tapas no rosto recobro a consciência olho no relógio já estou atrasado só dá tempo para lava os olhos e escovo os dentes, penteio o resto de cabelo, nem banho tomo só para não sair o cheiro de minha amada de minha pele.

Com a desculpa de estar atrasado tomo café rapidinho dou um beijo nela vou até o quarto dos meninos estão dormindo parecem dois anjos olho da janela e saio correndo lá vem o cata osso, seus faróis já apontam lá na esquina dou o sinal com a língua de fora.

Ele para, entro comprimento o motorista vou para o fundo tem mais alguns companheiros comprimento e me junto a eles no cochilo dá para sonhar um pouquinho com minha nega.

Ao chegar à garagem começa a rotina do dia o entra e saem de passageiros nos ônibus aqui você vê de tudo mulheres bonitas, homens bem vestidos cada um com seu estilo, crianças choram logo de madrugadinha deve ser com saudade de sua caminha.

Pena que eu não posso chorar também com saudade de minha cama, das costelas de minha amada, do cheiro de sua pele macia como de um pêssego, meu anjo que caiu do céu o que meus companheiros iam dizer vendo-me chorar.

Há deixa isto para lá, de manhã dentro do ônibus parece um jardim o cheiro suave do perfume e do banho tomado, o batom cheira, a roupa cheira, cabelos cheiram a perfumes doces e fortes.

Mas o dia vai passando o perfume que outrora passeava entre os bancos sai de sena e da entrada pelo o mau cheiro, cheiro do suor, o perfume nem passa mais perto não importa que seja de mulher ou de homem os mal cheiros são iguais.

Cheiro forte de mijo o azedo do vômito que sobe entre os bancos e no corredor, no meio da tarde não a nariz que resista, o almoço quer sair pela a boca, mas temos que engoli ele de novo, tudo isto temos que aguentar sentado na cadeirinha passando troco com o sorriso no rosto o suor escorre, eu sinto as gotinhas escorregar que vai parar no rego.

Até um peido você tem que saber a hora de dar, para não ter nem um passageiro por perto e reclamar, perante a lei somos todos iguais, mas dentro do ônibus só os passageiros tem vez, que descriminação é essa só eles podem peidar tem uns engraçadinho que grita to pagando.

Loucura é no final do dia não gosto nem de pensar horário de pico parece um estouro de boiada todos querem entrar no ônibus ao mesmo tempo e começa o empurra, empurra todos querem sentar, todos estão cansados.

O ônibus lota parece uma lata de sardinha mulheres reclama, gritam por causa de alguns engraçadinhos que aproveitam o aperto para lhe darem uma enconchada ou passarem à mão.

Outra dia teve um acontecimento desse um engraçadinho grita do fundo, ta ruim pega um táxi madame, a mulher fica nervosa tenta retrucar a fumacinha sobe da testa, mais não adianta, o som da risada dentro do ônibus é maior do que os gritos dela.

Mulheres grávidas, senhoras e senhores de idade reclamam por causa dos jovens não lhe darem o lugar para sentar, crianças choram por causa do aperto, outro dia vi uma mãe pegar pelo braço de uma criança e puxar gritando com ela, vai que dá.

A criança chora reclama, olhos só faltam sair, mãe tá doendo, mas a mãe não escuta, eu até tento ajudar na medida em que posso vendo sofrimento daquela criança, pego a pelo braço com bastante esforço consigo passá-la para o outro lado, chorando, toda amarrotada e despenteada.

A mãe olha para mim com o ar de irritada, cobrador você quase quebrou o braço do meu filho, eu olho para ela e fico sem palavras nesta hora só Deus para dá paciência mesmo assim peço desculpa.

Mas a viagem continua dentro do ônibus você vê de tudo, sente também quer ver a miséria, quando um infeliz sai atrasado de casa e está com dor de barriga não consegue fazer as suas necessidades fisiológicas na bacia do banheiro em seu trono só nesta hora qualquer pessoa vira rei, mas não resolve fazer dentro do ônibus.

Começa o aperto o suor desce pela sua testa, os olhos viram e as caretas junto com as cruzadas de perna, começa a puxar a cordinha dando pulinhos parecendo o São longuinhos mesmo pedindo com licença os passageiros do seu lado não estão nem ai com o sofrimento do camarada.

Tenta descer, mais esta longe da porta os gases começam a escapa quando os passageiros dão por conta o fedor sobe já não tem mais jeito à miséria já virou fato consumado não a cristo que aguente o mau cheiro, as pessoas olham para a cara do infeliz vê o alivio estampado em seu rosto e a mancha em sua calça o fedor já tomou conta do ônibus.

Passageiros reclamam começam a passar mal uns até vomitam, estomago fraco o fedor impregna nos narizes o incrível porque acham que a culpa é do cobrador por estar sentado, e não ter feito nada, que culpa tem eu por esta o ônibus lotado, mesmo vendo quem fez a miséria dentro do ônibus.

Depois que o homem fez as sua necessidades na calça os outros passageiros dão espaço agora não adianta mais.

Não vejo à hora de chegar em casa estou quebrado de ficar o dia todo sentado lendo, de vez enquanto ataco de escritor, escrevo umas linhas entre um passageiro e outro, quando chegar em casa minha nega que me desculpe vou jantar em pé não quero ver cadeira.

Outro dia teve um assalto dentro do ônibus foi uma loucura, dois pivetes entraram armados disfarçados de passageiros , quando o ônibus estava em movimento, eles se levantaram e anunciaram o assalto um apontou a arma para o motorista mandando os passageiros ficarem quietos o outro veio até a mim e gritando limpe a gaveta não deixe nem um conto tudo bem, eu pedir não me mate tenho família.

O pivete grita comigo tu só morre se fazer alguma gracinha, nesta hora veio na minha mente minha mulher, meus filhos o que um pai de família passa saber que sai de casa para trabalhar, mas não sabe se volta, limparam o caixa e foram embora, tivemos que ir para a delegacia fazer o boletim de ocorrência, os policiais disseram que iam atrás, mas ficou por isso mesmo.

Olho no relógio está quase na hora de ir embora, graças a Deus, conto os minutos daqui a pouco verei minha família, o ônibus não para de encher desce um, entra quatro mulheres dão de mamar para seus filhos, outros escutam músicas, outros leem livros e revistas.

Até que enfim o ônibus encosta na garagem os passageiros descem tenho que entregar a movimentação do dia só assim posso ir para casa ver minha família, tomar um banho, jantar, brincar com os meninos, assistir uma telinha, descansar um pouco e mais tarde deitar em minha cama e dormir agarrado com minha nega.

Porque amanhã começa tudo de novo, novos passageiros, novas estórias, na vida de um cobrador de ônibus cada dia tem um novo capitulo.

Paulo Pereira

PAULO PEREIRA
Enviado por PAULO PEREIRA em 09/11/2022
Código do texto: T7645917
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