AS MAZELAS DA DONA JOSEFINA
Dona Josefina morava numa pequena vila de uma cidadezinha do interior do Ceará. Residia com seu amado esposo em um agradável sítio, que ficava afastado 50 km da cidade, por estrada de terra. Local aprazível, bem arborizado e, pertinho de casa, um barreiro que abastecia o lugarejo com água potável. O companheiro, um senhor muito alegre e brincalhão, andava sempre de boné e óculos escuros. Enquanto dona Josefina era conhecida por suas propagadas doenças, pois estava sempre se queixando de dor por todo o corpo e dizia sempre que estava no fim, que não chegaria no ano seguinte. Alfredo, o marido paciente, sempre respondia em tom engraçado: "não morra mulher, porque se morrer eu caso novamente". E todo dia era uma doença diferente, já amanhecia com dor “nas cruz”, dizia que tinha sido da noite mal dormida, ocasionando mal jeito no espinhaço e machucando o mucumbu. Passava o tempo todo se queixando de um mondrongo na coxa esquerda, julgando que era um nervo torto de um jeito que deu na infância, pulando uma cerca no roçado, provocando uma tremenda dor nas “cadeiras”, que deixava seus pés adormecidos. Sentia quase diariamente um entalo e uma queimação que atrapalhavam seus afazeres domésticos, deixando-a sem fôlego. Dona Josefina reclamava demais, falava de muito calor, tomava três banhos durante o dia, e, de tantos incômodos, evitava sair de casa, até mesmo para ir à missa. Ela estava ciente de que isso era tramoia de algum mau-olhado, pois tinha um homem bonito e amoroso, que deixava muita gente com inveja, principalmente a mulherada da vizinhança. Amanhecia sempre com uma murrinha, um cansaço no coração, dormência em um lado do corpo e um desarranjo na barriga, medo terrível de ser um nó nas tripas. Queixava-se, ainda, de um argueiro nos olhos que deixava a vista nuviada. Dona Josefina nem mesmo queria sair de casa, por conta de um esporão-de-galo, o dolorido bico de papagaio e muitas dores nas juntas. Era muito sofrida, deixava o coitado do marido de ovo virado de tanta preocupação de ficar viúvo. Quando ia ao médico, levava tudo anotado, existiam algumas doenças que não poderia de jeito nenhum colocar o nome no papel. As doenças antigas o doutor falava: "vamos deixar essas de lado", ela ficava brava, porque no pensamento dela a enfermidade estava sendo desvalorizada. E, assim, foram muitos anos de sofrimento, muita gente que era sadia embarcou para o andar de cima: mãe, cunhado, irmã, vizinhos e até o sofrido e amado cônjuge que nada sentia, apenas, uma pá quebrada, um difruço bem antigo e o quarto arriado provocado por uma queda no quintal. Ah! Também se queixava de doenças dos nervos que lhe deixavam com o juízo incriziado, consequência das agonias diárias com a sua querida e adorável mulher. E, assim, foi a vida sofrida de dona Josefina, que, mesmo com tantas mazelas no corpo, ainda comemorou seus 95 anos de idade, mas sempre avisando que no Ano Novo não chegaria.