Três Aninhos : Alegria III
Enquanto o aniversário acontece, passo entre as pessoas , esbarro suavemente, peço desculpo e sorrio. Pego uma cerveja e procuro uma cadeira. Por um momento, me distancio, ainda que presente. Não é uma fuga, mas uma imersão nas três horas de celebração e alegria. Observo os docinhos sobre a mesa, o bolo temático, salgadinhos, refrigerantes. Toda criançada corre de um lado de um lado para o outro, entre gargalhadas e chororô também, pois o filho de uma das convidadas escorregou quando corria pensando ser o “Flash”. Não foi nada demais, não demorou muito e o fedelho já estava a mil por hora mais uma vez.
Amigos, conhecidos e demais convidados tagarelam sobre filhos, trabalho; a vida, a vida dos outros, novelas, futebol, carros, política, a bola da vez...; viagens feitas e sonhadas: Eis o mundo de fantasia e realidade dos adultos: Crianças crescidas.
O pessoal do “Karaokê” canta como se não houvesse amanhã. Eu até me ponho a cantar também junto aos destemidos cantores para uma parte da plateia que se diverte levemente embriagada. Alguns estão tão alheios ao que acontece, tão descontraídos. E é tão cômico a preocupação de alguns pais e mães em relação aos seus filhos (as) que não param de correr e pular. - Deixem eles se divertirem
Depois de sete músicas ou mais, os cantores debandam para a chegada de “certo” DJ atrapalhado que se perde nas “playlists”. Ora a música toca, ora trava tudo, mas o show deve continuar, faça sol ou faça chuva.
- É música de criança, gente! “Help – me, I need somebody”.
E tudo está sendo muito bom. Um momento tão agradável, tão leve, afável que passa sem que tenhamos notado que os minutos após a chegada já se passaram três horas. No final, todos saíriam com suas lembrancinhas, doces e salgadinhos para levar em pratos descartáveis e potes que jamais voltarão.
Três aninhos de existência nesse mundo excruciante e extraordinário ao mesmo tempo. Uma vida cheia de possibilidades. Toda uma jornada pra seguir, vislumbrar, vivenciar, lutar, aprender; todo um caminho pra surpreender, perder-se, encontrar-se e vencer. Para ela, hoje o mundo é uma grande brincadeira cheio de fantasias onde tudo se encaixa na sua vasta imaginação.
Papai e mamãe são seus guardiões, heróis e servos, nem precisa se preocupar, pois basta gritar: -Papai! Mamãe!E tudo acontece magicamente, mesmo com algumas ressalvas. Ás vezes, o ritual de invocação muda um pouquinho, pois é preciso bater o pé de vez em quando, fazer birra, berrar, chorar, chorar e chorar esperando que alguma aconteça para atender aos seus anseios, nem que seja um breve trovão: - Não! Respire, acalme-se, acolha,abrace: - Não é assim que as coisas são.
Aquele brilho nos olhos, aquele fúlgido sorriso, aquela alegria tão pura e espontânea no auge do momento do sopro das velinhas. Esse instante de júbilo que preenche cada coração e mente que agora canta “Parabéns pra você...”. Tudo tão sublime e sagrado eternizando-se pra ela. (...) Tão pequenina, tão frágil, inocente, tão linda; tão perfeita; tão faceira.
- Céus! Esse anjinho é a razão da minha própria existência: Amo, logo existo.
Então, contemplo apalermado aquele “serzinho”, que logo chama por mim e me desperta daqueles segundos dispersos de papai babão.
- Papai, papai, olha! Ela mostra como pular bem alto.
- Muito bem, filha! Papai está muito orgulhoso! E a levo ao colo e digo que podemos voar:
- Vamos?
- Eba, vamos voar! E voamos pelos céus atravessando as nuvens do seu mundo.
Passamos pela mamãe, dindo e dinda, tios (as); pelos coleguinhas, os cantores; brinquedos; pelo cachorro, balões, doces e o bolo. E tudo isso foi muito bom.