O João Atrevido
29.06.22
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Vejo da janela do meu quarto um João de Barro andando pelo gramado na entrada da nossa casa. Ele caminha com seu jeito característico, movendo sua cabecinha para frente para trás a cada passo que dá. Não se incomoda com nada ou ninguém seguindo decidido o seu caminho. Não sei qual é o destino. Sempre pelas manhãs há alguns Joãos ciscando a grama procurando comida e barro para construir suas casas nos postes na rua.
Tenho um gato em casa, “Pebas” seu nome, mistura de pidão com perebento, pois era da rua e nos adotou quando morávamos na praia e minha mulher falava que estava com seu pelo cheio de perebas e sempre pedindo comida. Intriga-me, pois o pequeno de asas segue sem sequer se preocupar com o felino, caçador por excelência, pois vez por outra aparece com penas na boca.
Continuo acompanhado o passeio do construtor de asas e vejo o nosso gato estirado ao sol da manhã junto ao portão da entrada da garagem, observando-o também. Talvez questione como um passarinho é tão atrevido em caminhar tranquilamente no meu jardim, sabendo que é minha caça predileta?
João continua o seu andar silencioso e passa para o piso frio da garagem. Curioso, levanto-me e vou até a porta de entrada, aberta, e vejo-o bicando o prato de ração do Pebas!
- Incrível! – exclamo surpreso com o pequenino pegando com o seu bico fino o grão de ração e batendo no solo para que quebre e fique em pedaços menores para comê-los.
Viro o meu olhar para o local em que está nosso gato, mas não o vejo mais lá. Procuro-o, pois sei que está de tocaia para abocanhar o atrevido que come a sua ração sem qualquer cerimonia. Encontro-o deitado estático embaixo do nosso carro acompanhando a refeição da sua talvez refeição. Quieto como uma estátua, com olhar fixo e músculos retesados prontos para o bote. João segue seu repasto, indiferente.
Fico ansioso e preocupado, pois não gostaria que ele comesse o querido intruso de penas, mas a natureza não perdoa, é implacável.
João percebe o perigo e começa a gritar estridentemente como que avisando aos outros que há um gato pronto para comê-lo. Inusitadamente ele corre em direção ao gato e alça voo quase junto a ele, que ficou desnorteado e sem qualquer reação pela ação inesperada do passarinho.
Meu coração disparou ou ver o pequeninho correndo direto para o felino prestes a atacá-lo. E ao voar nas barbas do Pebas, visualizei a cena mentalmente achando que daria o bote: ele pula agilmente e abocanha o João assim que levanta voo, em ação cinematográfica.
Mas minha imaginação se enganou, ainda bem! O João pousou no muro de divisa piando loucamente. Pebas saiu da posição de ataque, levantou-se e foi até o seu prato de ração, cheirando os rastros do João. Viu que eu estava parado a porta, veio miando até minhas pernas, se enroscando nelas ronronando.
O João atrevido se acalmou, parou de gritar e o dia seguiu.