Conto das terças-feiras – Menina prodígio

Gilberto Carvalho Pereira – Fortaleza, CE – 7 de junho de 2022

Luciana sempre foi muito inteligente, já aos quatro anos de idade sabia ler frases e escrever os nomes dos pais, dos avós e da empregada de sua casa. Ainda não tinha a letra perfeita, mas entendível. Embora sua coordenação motora ampla tenha se incorporado aos seus movimentos, permitindo-lhe, desde cedo, correr, brincar, pular e realizar outras atividades relacionadas ao impulso físico, a coordenação motora fina, que lhe proporcionava usar os pequenos músculos localizados nas mãos, para facilitar o manuseio de objetos e realizar atividades de cortar, desenhar, pintar e escrever com lápis, ainda precisava de ajustes, de treinamento.

Por mais que esmerasse, as palavras sempre tendiam para o alto ou para abaixo das linhas de seu caderno, embora não perdesse a esperança de um dia escrever certo, tudo o que lhe desse vontade. Os incentivadores eram, principalmente, seus pais e avós.

Certo dia, falou para a sua avó que queria escrever sobre sua vida, sobre seus pais, sua casa e suas amigas da escola. Não sobre os meninos, que não gostavam dela. Surpresa, a senhora falou para a menina que iria ajudá-la, desde que ela se comportasse e tirasse boas notas. Para tal, tudo foi combinado, a menina escreveria, todos os dias, uma espécie de diário, que a avó digitava e acumulava no disco rígido do computador. Uma cópia era sempre dada para a neta, que a lia com avidez, sorrindo aqui e ali, e pedindo para fosse tirada uma frase, acrescentar palavras, para o texto ficar melhor, dizia a garota. Assim, foram quatro meses, e o diário foi terminado. As notas melhoraram, mas a letra pouco foi modificada. Ela detestava caligrafia, e nunca se aventurou nesse caminho, com o consentimento da avó, que pensava: um dia ela vai fazer um bilhete para o namoradinho – quando tiver um – e vai caprichar.

Outro desejo seu, pintar. Vivia na mesa do computador da avó a mexer nos lápis e canetas, colocadas ali para o uso da vozinha, como a garota chamava, e, sobre uma folha de papel A4, desenhava sua família, o pai, a mãe e ela. Para cada roupa usada pelos seus personagens uma cor diferente. A avó, com todo o carinho, mantinha guardados esses desenhos e o diário. A vontade de aprender a desenhar era tão grande, chegando a sugerir ao pai, pagar aulas de pintura para a criança. A falta de tempo dos pais impediu, por hora, o atendimento à essa demanda da pequena.

Outro desejo, esse também muito parecido com a condição de seu ser, com a sua personalidade em formação. Pediu ao pai que pagasse aulas de balé para ela, recebendo como resposta que eles não tinham tempo disponível para mais essa tarefa. Retrucando, ela argumentou que as aulas aconteceriam com professores contratados pela própria escola, depois das aulas. Contra-argumentando, o pai lembrou que ela também tinha seção de psicomotricidade, ocupando uma boa parte de seu tempo no período da tarde. Conformada, a garota se calou e foi assistir televisão.

Naquela tarde sua avó a levou ao ateliê de pintura, para saber se ela poderia avançar nesse campo, já que demonstrara aptidão para a disciplina. Até o momento Luciana vem se destacando na aprendizagem do manuseio de telas, tintas e pincel. Seus colegas de ateliê, também de pouca idade, e até mesmos os de mais idade, ficavam impressionados com a desenvoltura que a colega demonstrava. Alguns dizem que ela vai ser uma grande artista, o que enche de alegria seus pais e familiares mais próximos.

Apesar de toda essa carga de atividades, a menina vem crescendo saudável, curiosa para aprender cada vez mais, delicada e compreensível. Vivaz e amável cativa a todos que dela se aproximam.

Gilberto Carvalho Pereira
Enviado por Gilberto Carvalho Pereira em 07/06/2022
Reeditado em 10/06/2022
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