O erotismo de um calão

Carlos não começou a trabalhar antes dos trinta. A mãe, farta de o sustentar, dizia-lhe constantemente: «Vê se começas a vergar a mola porque eu ando a perder a paciência para esta situação.» O rapaz, no entanto, fazia-se de mouco. E continuava sem pegar no trabalho. O pior é que não fazia nada. Nem em livros de escola pegava.

Durante anos, a única verdadeira ocupação de Carlos foi ver pornografia na televisão. Aquelas mulheres de cabelo oxigenado, de fio dental e de seios modificados, faziam-no pensar numa realidade alternativa. Deitado na cama ou sentado no sofá, Carlos imaginava que vivia em Las Vegas com a mulher dos seus sonhos. À mesa, a jantar com os pais, o rapaz sonhava que estava num restaurante caro com uma prostituta de gabarito. As pernas de um roçar-se-iam nas do outro e, numa questão de minutos, duas línguas colar-se-iam uma à outra.

O sonho dominava a vida de Carlos. Se lhe falassem de questões práticas, ele esconder-se-ia. Se lhe falassem da actriz pornográfica X, ele, de sorriso nos lábios, confessaria as suas paixões. Infelizmente, o sonho que comanda a vida é também o sonho que faz de nós pessoas infelizes. Com o passar dos tempos, Carlos foi sentindo falta de um carinho especial. As cassetes de vídeo já não lhe chegavam e, por vezes, olhar para o ecrã no qual as orgias se passavam, tornava-se penoso.

As pressões da mãe não desapareciam. «Quando é que começas a dar no duro?» Diga-se que a senhora tinha uma certa razão, uma vez que o seu filho já não era uma pequena criança que devesse ser guardada dentro de uma redoma de vidro. Carlos tinha trinta anos e, se se descontassem os tempos de meninice passados a brincar ao berlinde ou a dar pontapés na bola, já estava pelo menos sete anos atrasado para o comboio do trabalho.

Um dia, Carlos pôs-se a olhar para os classificados dos jornais, tentando encontrar algo que se pudesse encaixar na sua forma de estar no mundo. Logo na primeira página, saltou-lhe à vista um anúncio que de fazer crescer água no bico: Procura-se homem entre os dezoito e os trinta e três anos para protagonizar filme muito erótico.

«Caramba», disse. «Vou mandar o currículo.» E mandou. Passados dois meses, recebeu uma carta de resposta. Ansioso, nem quis abrir o envelope de forma civilizada. Rasgou-o e começou a ler. «Aceite.»

Aos trinta anos, Carlos, rapaz de grande sorte, começaria a trabalhar como actor pornográfico. Mais: conheceria todas as mulheres que o levavam à loucura. Porém, quando chegou ao estúdio que a produtora lhe indicara na carta, Carlos começou a sentir-se embaraçado. Sentiu as bochechas a aumentarem de temperatura quando se lembrou de que estariam muitas pessoas a olhar para o seu pénis. De qualquer forma, aquele tipo de ideias aparecia algo tardiamente, uma vez que as suas decisões já haviam sido feitas. A entrada do seu pénis no ânus da actriz era algo que, embora ainda não tivesse acontecido, se tornava obrigatória.

Frente-a-frente com uma mulher espampanante, que o faria vibrar se estivesse a visionar um filme, Carlos ganhou uma visão analítica. Por debaixo do cabelo amarelo brilhante da mulher, escondiam-se muitos cabelos brancos. As estrias acumulavam-se à volta da cintura da senhora. Não poderia haver dúvida nenhuma de que aquela mulher conseguiria excitá-lo mais ao longe do que ao perto. Mas o tempo para pensamentos esgotava-se. Impunham-se acções, gestos, movimentos. A câmara estava a filmar.

A mulher, ajoelhando-se no chão, começou a abrir a braguilha de Carlos, que desatou a transpirar. Já com o seu instrumento na mão, disse a mulher que, em anos e anos de profissão, nunca havia visto coisa tão grande. Carlos, embora rindo, começou a sentir nojo da situação.

Quando abriu a boca para engolir a carne do actor em estreia, a rapariga não conseguiu esconder as cáries. Este, desfalecendo, ainda pensou que poderia fugir. Mas não.

Paulo Rodrigues Ferreira
Enviado por Paulo Rodrigues Ferreira em 25/11/2007
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