A Saga de Godofredo XXV – O Sósia

29.05.22

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A frota do rei Ricardo estava quase à entrada do porto de La Valetta naquele alvorecer, tendo a de Schain à frente. Estavam os navios sarracenos enfileirados lado a lado em um grande círculo de defesa. Ricardo observou a posição da frota moura e ordenou ao seu comandante que informasse a Schain que lhes desse passagem, pois caso não abrisse o caminho, seriam atacados pelas forças cruzadas inapelavelmente. Enviou um ajudante de ordens em um escaler, para tanto.

Schain observava a situação, e ao lhe ser solicitada a passagem da frota do rei cristão, chamou o seu estado maior para uma reunião. Pediu que o enviado aguardasse a resposta.

Com os subcomandantes no convés do capitânia, Schain começou a reunião :

-Que Alá nos proteja e nos abençoe! O rei cristão pede passagem e vejo a oportunidade de atacarmos a sua nau de forma implacável! O prenderemos e trocaremos pelos nossos companheiros presos. É a nossa oportunidade de marcarmos nossos nomes na história!

Os subcomandantes mouros mais velhos e experientes se entreolharam estupefatos, sabedores que seriam aniquilados pelos cruzados com essa ação suicida proposta pelo jovem filho do general Abbdul. Um deles, o segundo de seu pai, Hamed, disse em nome de todos os demais:

- Irmão Schain, como decano dos subcomandantes e segundo no comando do seu pai, acho imprudente essa ação, pois seremos aniquilados! Devemos aguardar a reunião entre o nosso sultão e o rei cruzado para definirmos nossas ações. Que Alá nos proteja e abençoe!

Schain ouviu a resposta de Hamed indo em sua direção, e inesperadamente, sacou sua adaga e desferiu um violento golpe na barriga do porta-voz, jogando-o agonizante ao convés do navio .

-Alguém mais contesta a minha proposta?

Todos ficaram em silencio. Schain mandou dois deles retirarem o corpo de Hamed e o jogaram no mar. Depois, disse o seu plano aos restantes,:

-Vamos deixar a nau do rei passar e a cercaremos no centro de nosso circulo de defesa, aprisionando-o. Teremos que enfrentar o ataque dos cruzados, mas com seu rei preso, eles não quererão coloca-lo em risco de ser morto. Será nossa moeda de troca. Avise ao estafeta cristão que aguarda minha resposta, que a passagem está liberada. Que Alá nos abençoe!

Ricardo recebeu a resposta com alguma desconfiança, pois sabia da personalidade intempestiva de Schain. Chamou o comandante geral das forças cruzadas para definir a estratégia. Tinha um plano. O general Romualdo reuniu-se com ele. O rei falou:

-Desconfio do jovem mouro, é inconstante e imprevisível. Vou para o seu navio, que ficará ao final da nossa frota, pois ele deve querer me fazer de refém, atacando-nos ao entrarmos em seu circulo defensivo. Arrume um sósia, vista-o com minhas roupas e o coloque em posição de comando no meu navio e veremos o que acontecerá. Toda a nossa frota deverá estar preparada para a batalha, que acho inevitável!

A troca foi feita e o sósia colocado como se fosse o rei no navio real, navegando em direção ao circulo defensivo mouro, que se abriu. Ao passar o navio do rei com dois escoltas, Schain fechou a passagem e atacou as embarcações cristãs.

-Como imaginava! –comentou Ricardo.

Toda a frota cruzada partiu para o ataque aos sarracenos em uma batalha gigantesca. Eram cerca duzentos navios, sendo a maioria cruzada, pois os mouros estavam reduzidos a setenta navios. Ela durou todo o dia e inicio da noite. A força da investida cristã resultou na quase aniquilação do exercito mouro.

Na fortaleza cruzada via-se o horizonte praticamente negro pela fumaça da queima dos navios abatidos. A maré começou a trazer ondas tingidas de vermelho e corpos dilacerados, na sua maioria sarracena. Um morticínio! Saladino e Abbdul assistiam a macabra cena da torre junto com Godofredo , Janet e Aníbal.

-Schain não soube ser paciente e obediente ao seu comando, meu caro Saladino! Estão agora nas mãos do rei Ricardo! Não sei qual será o final desta tragédia! – disse Janet.

Vários navios mouros hastearam bandeiras brancas de rendição. A esquadra real adentrou pelo porto da capital maltesa no inicio da madrugada. O rei desembarcou com seus comandantes indo ao encontro de Janet , que lhe esperava no grande salão do castelo com os demais cruzados. Saladino e Abbdul voltaram aos seus aposentos. O rei começou a falar:

-Senhores não era necessário esse ataque suicida do jovem mouro, perdeu praticamente sua frota e seu exército. Seu intento de querer me fazer refém falhou, pois percebi que queria fechar o cerco ao meu navio, como o fez, mal sabendo que nele estava um sósia com minhas roupas e armas. Temos os mouros em nossas mãos e quero discutir com vocês o que pretendo em relação a Saladino, os seus homens e a situação na Terra Santa, o que mais me preocupa. Mas antes, conhecer o jovem que executou essa façanha histórica de prender o grande sultão e todo o seu estado maior sem derramar uma gota de sangue. Venha ao seu rei Godofredo, vou agora nomeá-lo general de nosso exercito e será o comandante e governador do sul da Itália e da Sicília. Tornou-se uma lenda que a historia jamais esquecerá!

Godofredo dirigiu-se até Ricardo, que o abraçou com entusiasmo e alegria, pedindo-lhe depois que se ajoelhasse , e com a sua espada, nomeou-o. Depois, entregou-lhe o anel de general e uma magnifica espada com o cabo cravejado com pedras preciosas. Terminada a cerimônia, o rei seguiu descrevendo seu plano para a solução da situação, pois tinha pressa:

Bem, temos Saladino e todo o seu exercito em frangalhos, sem poder exigir ou pretender qualquer acordo. Está em nossas mãos! Assim, penso em exigir a libertação de Jerusalém em troca da sua vida e da sua filha. Todos os demais comandantes serão enforcados, como Schain e seu pai. Malta continuará nossa, como Lampedusa e todas as demais ilhas mediterrâneas. Saladino ficará preso aqui até que Jerusalém seja liberada e assumirmos o seu controle. O que acham, quero a sua opinião sincera e objetiva, pois estamos vivendo um momento histórico inigualável! Falem por favor!

Todos se entreolharam preocupados e o silencio imperou por longos minutos. Então, Godofredo tomou a palavra:

-Meu rei Ricardo Coração de Leão, em primeiro lugar lhe agradecer a honraria e distinção que me foi dada, mas se não fosse os meus companheiros que me seguiram e executaram essa empreitada, nada disso aconteceria. É assunto que depois gostaria de falar com vossa alteza. Quanto ao que propõe à filha de Saladino, princesa Mira, há um pequeno problema, pois não sei se vossa alteza sabe, casei-me com ela, apaixonamo-nos perdidamente. Então, antes de qualquer ação com relação a ela, gostaria antes de conversar sobre o que aconteceu, pois não sabe de nada.

-Perfeito! E quanto ao enforcamento do estado maior de Saladino, de Schain e de seu pai, qual a sua opinião?

-Acredito que o sentimento de vingança será potencializado com esse ato punitivo, pois estaremos agindo como eles. Talvez se os prendermos separadamente em um local distante e ermo, nas pequenas ilhas ao longo da costa mediterrânea, seria uma solução salomônica e de grandeza, como é vossa majestade. Quanto a Abbdul, quase irmão de Saladino, de quem gosta como se fosse, penso que seria nossa garantia de que cumprirá o acordo de liberar Jerusalém e ser libertado quando da efetivação do acordo e assumirmos de fato a Terra Santa.

-E Schain, o que faríamos? – perguntou o rei.

-Acho que ele merece reconquistar a sua honra, pois foi por mim enganado e usado em todo esse processo, merecendo ter um duelo comigo para tanto!

-Mas ele esta sem a mão direita! Como usará a espada? – comentou Janet.

-Colocarei uma luva onde não poderei usar meus dedos desta mão, como ele – respondeu Godofredo.

-Mas usa a mão esquerda para lutar? Você não é destro? –perguntou Janet.

-Ele é ambidestro desde pequeno! – completou Aníbal, seu pai primordial.

-Bem, se é esse o seu desejo, o que mostra a sua honradez perante o seu maior rival, que assim seja. Mas se ele vencer terá o direito da sua liberdade, correto?

-Sim!

-Que assim seja general Godofredo. Quanto ao que propôs sobre os prisioneiros, pensarei e nos reuniremos logo ao meio do dia de amanhã. Agora preciso descansar um pouco. Ah, Godofredo vou liberar a princesa Mira para que fiquem juntos. Boa noite a todos!

Nota do Autor

É obra de ficção e qualquer semelhança e mera coincidência