FORRÓ DO “ESCORREGA LÁ VAI UM”

FORRÓ DO “ESCORREGA LÁ VAI UM”

Autor Moyses Laredo

Soube de um forró dançante, lá nos confins de um ramal de difícil acesso, me disseram que era mais “manso”, não tinha alvoroço, e só funcionava pela parte da tarde dos domingos, alguns amigos iam pela tranquilidade, além do mais, ficava bem pertinho da volta do rio, o que emprestava ao ambiente, um clima bem ameno, o forró chamava-se “Escorrega-Lá-Vai-Um” um nome intrigante para um lugar, ouvi falar dele algumas vezes, até que numa tarde de domingo, resolvi tirar a limpo e fui. Nada de anormal, ficava no final do ramal mesmo. Na fachada, havia um barzinho simples com poucas mesinhas espalhadas do lado de fora feitas de rodelas grande de tronco e base de um pau só, colado nelas um monte de propagando de cerveja, enfeando a beleza da madeira. Aos fundos, vinha o som de puro sofrência de Altemar Dutra - História de um amor (bolero) - Rogai Por Nós - Senhora - A Mais Linda do Mundo - As Folhas Verdes de Verão - Eu Nunca Mais Vou Te Esquecer - Jura-me - Que “murmuren”, realmente muito propícia para dançar, de lá onde vinha o som, me disseram que havia um tablado da pista de danças na beira do barranco. Fiquei um bom tempo apreciando as músicas, depois por curiosidade quis ver o tal tablado que falavam. Fizeram uma puxada apoiada nuns paus para a sustentação, o tal tablado, pendurava-se literalmente no barranco, balançava é muito, quando o pessoal dançava, não possuía parapeito nem nos fundos nem nas laterais, dava direto para um "curvão" (fundo da encosta) era um barranco de uma boa altura, o caminho de descida cheio de arbustos espinhoso, tocos diversos e pequenas árvores nascidas na saia, tudo acabava na beirada do rio, fiz questão de examinar aquela obra. Me questionei, porque não colocaram uma proteção? Alguém poderia cair dali e se lascar lá embaixo, isso se já não houvesse caído alguém.

O dono do bar, seu Firmino, homem baixo gordo, meio careca, dizia ele que era a sua testa que havia crescido, coisa de família, sempre com um pano, já escurecido no ombro, que como hábito, passava nas mesas. Como cliente novo, me recebeu bem, tratou de arrumar uma mesinha debaixo do beiral, longe da beirada e ali fiquei saboreando uma gelada (digo, quase gelada), tirando gosto com sardinhas fritas. A vitrola tocando alto, vez por outra alternava de Altemar para os “mela coxas” bregas brabo que não dava para decifrar nenhuma palavra que o cantor dizia, igualzinho como falam as rezadeiras brandindo aquele emagrecido galhinho de arruda. Nesse dia meio chuvoso, tablado molhado, alguns casais bêbados continuaram dançando, já não interessava a música, giravam que nem piões, esbarrando nas mesas, muito afoitos, cheios da “marvada” mas tudo numa boa, sem brigas. Num dado momento, um casal que passou pela minha mesa rodopiando, subitamente sumiu de vista, corremos todos para o beiral do tablado ainda se podia ver o casal rebolando barranco à baixo, entendi logo o nome bem sugestivo do forró!

Esse era o divertimento principal do seu Firmino, todas as vezes que alguém escapulia, ele se entortava de rir atrás do balcão, vi benzinho ele dar uma ticada, com o canivete da outra ponta do abridor de cerveja, no pilar de acariquara, notei que o pau estava cheio de riscos feito lombo de Curimatã, (prochilodus britskii), todo ticado. Passado um tempo, os dois que caíram, subiam molhados, sujos e lascados, mancando, cheios de riscas nas costas, com parte das roupas rasgadas, a cara de bestas deles era impagável, ainda bem que não tinham quebrado nada. O bom é que a cachaça passava na hora. Se sentaram numa mesinha próxima a minha, não queriam mais nada perto da beirada, seu Firmino servia-lhes uma geladinha para rebater, sempre virava o rosto, com a mão na boca, para esconder o riso. Os dois ficavam quietinhos só se espalmando, batendo a sujeira do mato e a terra da roupa, conversando e rindo, só se lembrando da queda. Gostei do lugar, sempre que podia, ia por lá, passei até a torcer junto com o seu Firmino.

Molar
Enviado por Molar em 26/05/2022
Código do texto: T7524664
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