Conto das terças-feiras – Casamento à vista?
Gilberto Carvalho Pereira –Carcavelos, PT, 10 de maio de 2022
Jorge Luiz e Isabeli trocaram olhares no primeiro encontro, primeiro dia de aula, ainda na escada que dava acesso ao prédio principal do estabelecimento escolar. Dois adolescentes de dezesseis anos ele, e quinze ela. Foi fogo de paixão, paixão avassaladora, ainda não haviam travado nenhum diálogo, muito menos combinado esse amor à primeira vista. Já na parte interna do colégio se depararam com um enorme corredor, com salas dispostas para ambos os lados. Foi o primeiro ato de uma sofrida separação, com um indo para a direita e o outro para a esquerda, iriam estudar em classes diferentes, faziam séries diferentes.
Foi uma verdadeira tortura as primeiras horas de aula, ambos estavam completamente desconcentrados, no mundo da lua, como dizem nesses casos. Por mais que os professores falassem, cada um em sua sala, mais alto para acordar os dois, mas eles vagueavam pelas nuvens, esperando a campainha tocar, determinando o início do recreio. Aquele encontro deixou-os mergulhados em pensamentos mil: quem seria ele? Quem seria ela? A insegurança, sentimento comum entre ambos, estava deixando-os desconfortáveis. Como seria a primeira abordagem, quem tomaria a iniciativa? Grande dilema.
A campainha tocou, os dois se assustaram, estavam absortos em conseguir uma desculpa para se aproximarem, conversarem, e se conhecerem. Cautelosamente deixaram suas salas e dirigiram-se ao grande pátio, onde já estavam quase todos os alunos, conversando, jogando bola, lanchando, ou sentados nos bancos dispostos estrategicamente nos quatro pontos do pátio.
Os olhares se encontraram, um tímido sorriso se viu nos lábios de cada um. Acenos com as cabeças, concomitantemente, levara-os a procurarem um banco para conversarem, o segundo tempo de aula foi esquecido, ficaram ali sem serem incomodados. Parecia que já se conheciam há muito tempo. Todas as dúvidas entre eles, foram dirimidas, já riam por qualquer coisa dita, ou não dita. De um encontro casual estava surgindo uma grande amizade, que na mente dos dois poderia se estender a um namoro.
Três meses depois, esse encontro evoluiu para uma amizade mais séria, principalmente para os dois. Os pais de Isabeli já tomaram conhecimento do garoto, mas alertava-a sobre os cuidados que deveria ter nesse relacionamento, respeito mútuo, tentar um relacionamento com a família dele para saber se seria bem aceita. Sua mãe era a mais preocupada, queria saber quem era a família do garoto. Procurou nas redes sociais, no google, em jornais etc. Ficou sabendo que se tratava de uma família de boas finanças, bem colocada na sociedade, cujos pais eram médicos e donos de uma clínica médica.
Certa manhã, depois das aulas, o casal foi até à casa de Isabeli, conhecer os pais dela, já que isso ainda não fora possível. Na ocasião o garoto, a mando de sua mãe, fez um convite para que os pais da garota fossem jantar, àquela noite, em um determinado restaurante de luxo da cidade. Preocupada, a mãe da adolescente procurou saber quanto, em média, custavam os pratos do restaurante. Queria estar preparada caso tivesse que pagar a parte deles. Inteirada dos valores, os quais achou um pouco caro, foi ao banco e retirou algum dinheiro, o suficiente para cobrir aquela despesa. Era uma família de classe média, diferente da família do garoto.
Ao chegarem ao restaurante, ficaram deslumbrados com a pompa de salão principal, onde estaria sendo comemorado o aniversário do adolescente. Lá pelas tantas, já quase ao final do jantar, a mãe de Jorge Luiz, segurando uma garrafa de champagne, legítima, e duas taças, chamou os dois pombinhos e, fazendo uma saudação, encheu um pouco do precioso líquido nas taças. O garoto, entrelaçando o seu braço no da garota, proferiu a frase que os apaixonados sempre pronunciam: “viva o amor!”.
A mãe de Isabeli entrou em parafuso, achando que aquela situação estava indo longe demais, muito depressa. Não era hora de eles pensarem sobre coisa tão séria, naquela idade. Ficou injuriada com a cena, não queria ver sua filha, de apenas quinze anos, já pensando em casamento. Foi até a mesa onde se encontravam os dois e, segurando o braço da filha, arrancou-a de lá com o intento de levá-la para casa. Os demais presentes ficaram horrorizados com a atitude daquela mulher, estavam em ambiente de pessoas civilizadas e comportamento semelhante não era esperado. A mãe do garoto segurou o menino, para que não corresse em direção à namorada, não seria de bom tom! Os dois nunca mais se viram, a garota foi mandada para morar em outros estado, em casa de parentes, e prosseguir seus estudos por lá.