Conto das terças-feiras – A jovem do Parque
Gilberto Carvalho Pereira – Milão, Itália, 26 de abril de 2022
Estava sentado em um banco de madeira, num dos parques da cidade de Milão, Itália, apreciando a paisagem à minha frente, tendo como companhia, seus frequentadores. Alguns sentados na grama, formando pequenos grupos a conversarem, outros deitados, talvez namorando, poucos correndo, homens, mulheres e crianças a brincarem, num domingo de Páscoa. Sons, vozes vindas de todos os lados, de diferentes idiomas e sotaques, pululavam de todos os recantos nesses mais de quarenta e sete hectares de extensão. Árvores de vários portes e uma vegetação rasteira bem verdinha, recebiam alegremente pássaros a voarem para lá e para cá, como prenunciando uma bela tarde de sol, naquele primeiro dia de Primavera, do ano de 2022. O local, refrescado por agradável lago artificial, repleto de patos, completava o quadro que me deliciava a vista. Estava no Parque Sempione, construído entre 1890 e 1893 seguindo o estilo dos jardins ingleses.
Em dado momento passei a observar, mais detalhadamente, as pessoas que passavam pelas alamedas não pavimentadas desse parque, localizado atrás do Castelo Sforzesco, em direção a um monumento que me remetia ao Portal de Brandemburgo, que conheci quando de minha ida à cidade de Berlim, em 1995. Aquela viagem foi um prêmio para mim. Acabara de me aposentar, após trabalhar por trinta e dois ano, ininterruptos, quando fui convidado a realizar as mesmas atividades, em um projeto de pesquisa na área de floresta, dentro do Convênio Governo Brasileiro x Governo Alemão.
Foi a minha entrada no circuito de viagens à Europa. Havia prometido à minha namorada, na ocasião, que só me casaria quando fosse possível passar a lua de mel na Alemanha. Demorou, mas aconteceu, não a lua de mel, mas para comemorar os nossos vinte e cinco anos de casamento, nossas bodas de prata.
Bem, voltemos ao parque. Como eu dizia, gente desfilava à minha frente. Era gente, gente, gente, como escreveu certa feita um estudante que fazia prova de redação para entrar em uma faculdade de Belém do Pará, sobre o Círio de Nazaré Não eram modelos do quadrilátero da moda de Milão, - Quad d’Oro -, zona comercial de luxo no bairro Centro Storico, cuja sua principal rua é a Via Monte Napoleone. Pessoas simples, ou não, de todas as idades, crenças e origens, situação difícil de qualificar nos tempos atuais, umas bonitas, outras não, disputam espaços nesse ambiente.
Diferentemente da nossa estada anterior nesse País, as cidades italianas não fervilhavam de tanta gente, havia paz e tranquilidade. Hoje, o aumento do turismo e o de refugiados de guerras têm deixado as cidades da Europa menos tranquilas.
Alguns desses usuários de primeira visita paravam à minha frente, para solicitar informações, eu meneava a cabeça dando a entender que estava ali pela primeira vez. Eles sorriam, pediam desculpas e continuavam em marcha.
Uma jovem, falando espanhol pediu permissão para também sentar-se ao meu lado. Aquiesci, e ela sentou-se. Fazia frio, a moça não estava bem agasalhada. Percebi que seus músculos da face tremiam e os dentes batiam, devido a fácil mobilidade de sua mandíbula, fenômeno inerente a todos nós.
Calada, olhava de um lado para o outro. Parecia procurar alguém, percebi o seu desconhecimento sobre o local onde se encontrava, estava perdida. Com o meu fraco portunhol arrisquei algumas palavras. A princípio ela não entendeu, depois, ao falar vagarosamente, passei a ser entendido. Fiquei sabendo que se perdera de seus pais e já procurara por todo o parque e não os encontrara. Estava cansada e eu não sabia o que fazer. Bem agasalhado, ofereci-lhe um de meus casacos, hesitante ela estendeu as mãos para pegá-lo.
Perguntei-lhe se não seria interessante procurar um policial, ir a um posto de polícia para relatar o acontecido. A resposta foi negativa, parecia que alguma coisa lhe impedia de tomar tal atitude. Comecei a ficar desconfiado, seria algum estratagema para fazer-me cair em logro? Principalmente porque já me entendia perfeitamente, me observava da cabeça aos pés.
Foi então que percebi dois homens e uma mulher, ao longe, a nos observar. As características raciais eram idênticas e se dirigiam cautelosamente em nossa direção. Não pareciam que estavam preocupados com o desaparecimento da garota que estava ao meu lado. Pressenti o perigo e, mais que depressa levantei-me, apontei para umas pessoas que estavam vindo e disse-lhe que o meu pessoal estava chegando. Despedi-me e afastei-me, sem olhar para trás.