Tarde de Forró
Tarde de Forró
— Para onde estamos indo? — perguntei ao meu primo mais velho Josué naquela tarde ensolarada de domingo.
— Calma, Rodolfo, que é surpresa para você. — ele me respondeu.
Já havia um tempo que minha mãe dizia que eu tinha que sair do meu quarto fechado e ir a algum lugar com meu primo.
— Você só fica trancado nesse quarto lendo. — era o que minha mãe sempre me falava. — Pois tome um banho, coloque uma roupa bonita de domingo e saia por aí com seu primo Josué. Tem muita coisa que ele pode te ensinar.
— Pois eu não quero, mãe. Sou caseiro, prefiro passar as tardes de domingo dentro do meu quarto lendo os meus livros. — eu respondia.
Mas naquela tarde não teve como eu escapar. Estava no meu quaro, sentado na poltrona, lendo Dom Casmurro pela terceira vez, analisando com atenção o romance para ver se Capitu havia traído ou não seu companheiro quando minha mãe e meu primo Josué começaram a bater na porta me chamando.
— Rodolfo, abra já esta porta e saia daí, precisamos falar com você.
— Agora não, minha mãe. — respondi — Mais tarde eu vou até a sala e nós conversamos.
— Abra logo, Rodolfo. — disse Josué— Venha conversar com a gente na varanda, pegar um pouco de sol e tomar uma laranjada.
— Agora não. — respondi já sabendo o que eles queriam. — Estou numa parte boa do livro.
— Abra a porta, Rodolfo, isto é uma ordem. — disse minha mãe. — Se não abrir vamos ficar aqui gritando a tarde toda e você não vai ter paz para ler.
Vencido pela insistência dos dois, levantei, larguei o livro sobre a poltrona e abri a porta. Nós três fomos até a varanda onde mamãe deu um copo para cada e serviu uma laranjada gelada. Eu já sabia o que eles queriam, mas fiz que não sabia, perguntando:
— O que vocês tanto querem atrapalhando minha leitura?
— A gente só quer que você saia um pouco de casa. Está um domingo tão bonito. Você podia sair com seu primo Josué.
— Mas eu já disse que não gosto de sair. — insisti.
— Eu já conversei contigo. Você já tem barba na cara. Daqui a pouco precisa arranjar uma companheira e se casar, mas nenhuma mulher vai vir aqui em casa e bater a nossa porta te procurando. Você vai ter que sair para a rua e procurar uma namorada.
— Mas ainda é cedo para isso, mãe. Preciso estudar mais primeiro.
— Você já estuda bastante durante os dias da semana. Pode tirar o domingo para sair com seu primo Josué. — disse mamãe.
— É mesmo, primo. Vamos nessa comigo. Garanto que você vai gostar. — tentou me convencer o primo Josué.
E não preciso nem dizer que depois de minha mãe e meu primo tanto insistirem, eu acabei cedendo, fui até o banheiro, tomei um banho, coloquei roupas limpas de domingo e quando vi já estava caminhado com Josué naquele fim de tarde bonito.
No caminho ele me ofereceu um cigarro, que eu neguei. Achava o cheiro nojento.
Andamos por uma longa rua de terra até que chegamos no tão aguardado lugar. Na porta uma placa com letras garrafais dizendo: TARDE DE FORRÓ.
Então era ali o tal lugar onde Josué queria me levar, num forró. Logo minhas pernas tremeram. Eu não sabia dançar. O que faria num lugar desses?
Pagamos a portaria e entramos. Lá dentro era escuro e tinha algumas luzes coloridas que rodavam. Havia um grande salão onde pares dançavam e no final, num palco, um homem tocava teclado e cantava.
— Vamos no bar pegar uma cerveja. — disse Josué me puxando pela camisa.
Fomos até o bar onde Josué pegou duas latas de cerveja. Me deu uma e ficamos ali olhando os casais dançando enquanto bebíamos. Josué balançava a cabeça acompanhando a música, e eu estava ali travado, só olhando o movimento.
— Eu tenho uma estratégia para quando venho aqui. — disse Josué. — Vamos ficar perto da porta do banheiro feminino. Sempre tem mulher passando por lá. É lá que vamos arrumar nossas garotas para dançar.
E então fomos nós dois até a porta do banheiro feminino. Após alguns minutos Josué já estava conversando com uma moça baixa, morena. Logo eles estavam dançando no meio do salão, e achei engraçado como Josué dançava bem. Agora era minha vez de entrar em ação.
Vi uma mulher mais velha que estava sozinha ao meu lado. Cheguei meio desajeitado dizendo:
— Oi. Podemos dançar?
Ela não disse nada, apenas me deu a mão direita e me puxou para o meio do salão, e ali começamos a dançar, ou pelo menos a tentar dançar. Eu sabia que a dança era dois passos para um lado, dois passos para o outro, mas eu não tinha gingado de dançarino. Eu simplesmente dava os passos com o corpo duro. Após alguns segundos tentando dançar, minha parceira disse que precisava ir ao banheiro e me deixou ali sozinho.
Meio frustrado, decidi que não chamaria mais nenhuma mulher para dançar e fui até o bar decidido a gastar todo dinheiro que minha mãe tinha me dado em bebida. Tomei conhaque, vodka e cachaça.
Minha cabeça começou a rodar e quando dei por mim estava do lado de fora da casa de forró, vomitando no chão com Josué ao meu lado.
— Que bonito, hein, Rodolfinho. Se for para fazer isso, não precisa sair comigo nunca mais. — disse Josué chamando minha atenção.
Em casa, enquanto me xingava, minha mãe me dava café forte e me jogava debaixo do chuveiro frio.
Passei o maior vexame, e acho que fiz Josué passar vergonha no forró também, mas pelo menos imagino que minha mãe e meu primo ficariam um bom tempo sem tentar me fazer sair de casa. Imagino que consegui o que queria.