O Jesus Que Não Perdoava...
O vigário da paróquia de um dos maiores bairros de São Luís do Maranhão - a minha histórica, bela e acolhedora cidade natal - resolveu encenar uma peça teatral sobre a Paixão de Cristo. Arranjou local, escalou atores, atrizes, figurantes e o mais que valesse. O ator escolhido para o papel de Jesus Cristo foi o Lourival, um cabra magrelo e mais zangado do que um siri na lata.
O certo é que Lourival, com muita seriedade e devoção, preparou-se para representar dignamente o seu papel. O problema é que, por motivos óbvios, ninguém queria fazer os papéis dos soldados romanos que no dia do Calvário espancaram Jesus, e já no desespero, apenas na noite da quinta-feira da Semana Santa o vigário conseguiu convencer três rapazes a aceitarem esses papéis. Por triste coincidência, entretanto, todos os três tinham uma rixa antiga com Lourival, fato que não chegara ao conhecimento do vigário.
E então, com toda a pompa, levou-se a efeito na principal praça do bairro, a Paixão de Cristo. E foi com um certo susto que Lourival – o Jesus Cristo – viu que os três soldados que o prendiam eram três rancorosos desafetos seus, mas, como o bom cabrito não berra, ficou na sua. Contudo, mais lá na frente, sentiu que os soldados que o agarravam estavam batendo pra valer mesmo. Aquelas chicotadas nem o próprio Jesus suportaria e Lourival só não deu berros de dor porque nunca ouvira falar que Jesus tivesse amarelado nessa hora! Para sorte de Lourival, acabou o ato e o pano desceu. Um novo ato só começaria dez minutos depois, mas o contrarregra era desastrado e subiu o pano antes do tempo.
E o que se viu ninguém jamais verá: Jesus Cristo estava armando o maior barraco nos bastidores do palco! Furioso, mandando os mais cabeludos palavrões, estava caindo de porrada e pontapés nos soldados romanos depois de já ter quebrado duas cadeiras nas costas deles!